Rangel Alves da Costa*
O amigo Geraldo Júnior, administrador do
grupo “O Cangaço” no Facebook, após mostrar três cartazes de filmes sobre o
cangaço, lançou a pergunta: “Em sua opinião, qual desses três filmes sobre a
vida de Lampião foi o melhor?”.
Os três cartazes mostrados são dos filmes
“Meu nome é Lampião” (1969), com Milton Ribeiro e direção de Mozael Silveira;
Lampião, O Rei do Cangaço (1964), com Leonardo Vilar e direção de Carlos
Coimbra; e a minissérie “Lampião e Maria Bonita” (1982), com Nélson Xavier e
Tânia Alves, com direção de Luiz Antônio Piá e Paulo Afonso Grisoli.
Para além das opiniões pessoais, vez que
tanto os filmes como a minissérie possuem méritos que devem ser reconhecidos,
prefiro modificar o questionamento feito para propor outro: “Qual ator melhor
representou Lampião?”. Pergunta, aliás, que já foi proposta no grupo de estudos
cangaceiros.
Como se sabe, a saga de Virgulino e seu bando
já foi levada ao cinema e à televisão mais de uma dezena de vezes. Quando não
tem Lampião como personagem principal ou mesmo o cangaço como trama de fundo,
utiliza-se da ficção para mostrar a valentia de um povo rude frente ao poder
opressor. Jagunços, cangaceiros, coronéis, beatos, renegados, bandoleiros, todos
fazem parte desse contexto nordestino mitificado na dramaturgia nacional.
Neste sentido, célebre é o filme “Deus e o
Diabo na Terra do Sol” (1964), com direção de Glaubert Rocha. É uma trama cujo
enredo explora o tema cangaço sem se ater à verdade dos fatos, pois fazendo da
ficção o espelho do confronto entre o bem e o mal, ou seja, entre os explorados
e a implacável perseguição dos exploradores, através de Antônio das Mortes. Do
mesmo modo “O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro”, também de Glaubert Rocha.
No filme, Antônio das Mortes é contratado para dar fim a uma nova liderança
cangaceira surgida nos sertões nordestinos.
Além dos clássicos de Glaubert Rocha, o
cangaço foi explorado sob diversas vertentes, mas quase sempre através do
espectro dualístico do bem e o mal ou do bem contra o mal. Há “O Cangaceiro”
(1953), dirigido por Lima Barreto; “Grande Sertão” (1965), dirigido por Geraldo
Santos Pereira e Renato Santos Pereira; “Quelé do Pajeú” (1969), dirigido por
Anselmo Duarte. E também “Corisco e Dadá” (1996), de Rosemberg Cariry; “Baile
Perfumado” (1969), de Lírio Ferreira e Paulo Caldas; “Corisco, o Diabo Louro”
(1969), de Carlos Coimbra. Muitos outros títulos possuem o cangaço como trama
de fundo, sendo que até mesmo pornochanchadas e filmes eróticos se basearam na
vida cangaceira.
A televisão sempre foi buscar nos temas
nordestinos a certeza de sucesso. Assim ocorreu com “Mandacaru”, novela exibida
pela TV Manchete entre os anos de 1997 e 1998, e reexibida pela TV Bandeirantes
em 2006. Faz do mandacaru a simbologia para os conflitos numa região nordestina
conflagrada pelo temor dos cangaceiros desgarrados após a morte de Lampião e
Maria Bonita. Mais recentemente a TV Globo exibiu “Cordel Encantado” (2011),
narrando uma típica saga sertaneja de amores marcados por confrontos
familiares, jagunços, coronéis, cangaceiros e fanatismos.
Contudo, o melhor diretor de todos os filmes
já produzidos acerca de Lampião, o verdadeiro, chama-se Benjamin Abrahão Botto,
um libanês radicado no Brasil, ex-secretário do Padre Cícero, e que após a
morte deste se enveredou pelas caatingas acompanhando o bando de Lampião. Abrahão
havia se encontrado com Lampião em 1926, quando este chegou a Juazeiro para
receber a patente de Capitão. Fotografado e filmado, e vaidoso como era,
certamente que Lampião nem pensou duas vezes quando o fotógrafo pediu permissão
para registrar o cotidiano do bando.
A partir da lente e da filmadora de Abrahão,
não há como não ter a certeza que Lampião foi quem melhor representou a si
mesmo. A cada fotografia ou a cada película, o que se observa é um Lampião
preocupado com a pose, com a aparência, com o enquadramento, com a imagem para
a posteridade. Não há cena em que o Capitão não esteja se mostrando como
desejaria ser conhecido no mundo exterior.
Lampião era verdadeiro modelo fotográfico.
Mostra-se imponente caminhando pelas veredas sertanejas, quando aponta sua arma
para ser filmado e fotografado, quando se coloca perante cartas ou jornais para
o flash do libanês. Não só Lampião, mas todo o bando gostava de ser
fotografado. Aquela fotografia de Maria Bonita sentada entre os cachorros
Ligeiro e Guarany, e Lampião em pé com uma revista à mão, faz recordar um
instantâneo da nobreza europeia num belo jardim de inverno.
Mas não, apenas os carrascais nordestinos, a
dureza dos tempos permitindo um instante de rara beleza. E mais um exemplo do
quanto humano havia também no cangaço. Um rei e uma rainha do nosso mundo.
Nosso tão belo mundo nordestino.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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