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quinta-feira, 1 de outubro de 2009

O SERTÃO NÃO PRECISA DE UMA CIDADE-PÓLO

O SERTÃO NÃO PRECISA DE UMA CIDADE-PÓLO

Rangel Alves da Costa*



Por mais que os governos federal e estadual priorizem o desenvolvimento de ações nas microrregiões do Estado de Sergipe a partir de cidades-pólos ou das chamadas sedes regionais, e isto também seja defendido com unhas e dentes pelos políticos que resguardam os interesses das elites políticas, comerciais e industriais das ditas regiões, a verdade é que esta centralização de comando, de projetos e de atuações em nada beneficia os municípios que à sede regional ficam vinculados. Pelo contrário, o extraordinário desenvolvimento de um sempre será em detrimento dos outros, como será demonstrado.
O estado de Sergipe possui 21.910,362 km², uma população estimada de mais de 2 milhões de habitantes, seus 75 municípios estão divididos em 13 microrregiões (Agreste de Itabaiana, Agreste de Lagarto, Aracaju, Baixo Cotinguiba, Carira, Cotinguiba, Estância, Japaratuba, Nossa Senhora das Dores, Própria, Sertão Sergipano do São Francisco e Tobias Barreto) e 3 Mesorregiões (Agreste Sergipano, Agreste de Lagarto e Sertão Sergipano). Além dessa divisão oficial elaborada pelo IBGE, quando o governo estadual vai desenvolver ações específicas, por exemplo, nas áreas da saúde, educação, turismo e agricultura, costuma escolher e delimitar áreas de abrangência, formando microrregiões de atuação e, em cada uma delas, elege uma cidade-sede ou pólo, na qual é instalada toda uma infra-estrutura para a realização das atividades em toda aquela região. Geralmente a cidade escolhida é a maior, mais desenvolvida economicamente ou politicamente mais influente.
Na região sertaneja de Sergipe, situada na mesorregião do Sertão Sergipano e na microrregião do Sertão Sergipano do São Francisco, formada pelos municípios de Canindé de São Francisco, Feira Nova, Gararu, Gracho Cardoso, Monte Alegre de Sergipe, Nossa Senhora da Glória, Poço Redondo e Porto da Folha), a sede regional para as ações governamentais, sejam elas quais forem, é sempre Nossa Senhora da Glória a cidade escolhida. Para exemplificar, naquela cidade tornada pólo regional estão a Delegacia Regional de Polícia, o Hospital Regional, a Delegacia Regional da Secretaria de Educação (DRE-09), o DETRAN, o CDL, o Departamento de Rodagem, o Deagro, a Vara do Trabalho de Nossa Senhora da Glória e a Agência do INSS na região, dentre outras delegacias, agências e sedes de órgãos governamentais.
Pelo que se sabe, brevemente um campus avançado da Universidade Federal de Sergipe deverá ser instalado na localidade, com o objetivo de atender a demanda estudantil da região sertaneja. Do mesmo modo, aventa-se na total implantação de uma Unidade de Ensino Descentralizada do Instituto de Educação Tecnológica de Sergipe, antigo CEFET, ainda este ano. Outros importantes núcleos estão programados ou já em fase de instalação. Inegáveis são os aspectos positivos trazidos por estes órgãos, principalmente no que diz respeito à tentativa de aproximação da população sertaneja aos serviços disponibilizados por tais instituições. Facilitando o acesso, minimiza os problemas com a distância e os deslocamentos desgastantes até a capital do estado. Contudo, por trás de tais benefícios existem outros aspectos que não podem ser esquecidos.
O Hospital Regional Governador João Alves Filho, localizado naquela cidade, é um exemplo de como a regionalização não funciona a contento em muitos casos. Para se ter uma idéia, a unidade hospitalar, que jamais alcançou seus objetivos de funcionamento e muito menos de atendimento, ficou fechada por três anos. Aquele núcleo de saúde que deveria atender a onze municípios do entorno passou por reformas, mas mesmo assim ainda continua apresentando problemas estruturais, de falta de profissionais e de oferta de especializações médicas. Em síntese, o serviço de saúde prima pela precariedade e não tem atendido aos anseios da população local e muito menos da região. A conseqüência mais visível disso é a contínua superlotação do Hospital João Alves Filho em Aracaju. O pior disso tudo é que as verbas são destinadas a um hospital regional que nunca disse a que veio e os pequenos hospitais das demais cidades interioranas ficam à mercê dos parcos recursos de poucos convênios ou da disponibilização de verbas das próprias prefeituras.
A escolha de uma cidade-pólo como base para o desenvolvimento de ações governamentais, quando muito, só atende aos interesses da própria localidade, do município especificamente. Para receber a implantação dos órgãos, os governos estadual e municipal têm que investir em infra-estrutura, saneamento e numa série de ajustes urbanísticos, paisagísticos e de acomodações para os profissionais e para a população que até ali se desloca. Isto implica em investimentos consideráveis que, num curto período, trarão retornos extremamente positivos para a melhoria na qualidade de vida, para alocação de mão-de-obra local no mercado de trabalho, para o aumento de renda, circulação de riquezas, incremento no comércio e na produção industrial, dentre outros fatores.
A tese ora defendida, então, é que a polarização do sertão como centro de interesses continue existindo, porém de modo que essa regionalização seja descentralizada dentro da própria região sertaneja, onde cada município possa ser destinatário da instalação de alguns órgãos e de programas governamentais permanentes. Municípios como Poço Redondo, Porto da Folha, Canindé, Monte Alegre e Gararu não podem continuar mais apenas como atores coadjuvantes desse processo de interiorização de benefícios, muito menos devem ser vistos pelos governantes como irmãos pobres entre iguais onde qualquer esmola será motivo de aplausos, palanques e foguetórios. É preciso investir com seriedade, através da oferta de benefícios permanentes e que possibilitem o pleno desenvolvimento de cada um.
As potencialidades desses municípios sertanejos são tamanhas que as menores ações são revertidas em duradouras realizações, pois todos sabem que o pouco que conquistam servirá como base da própria sobrevivência. Um município como Canindé do São Francisco, por exemplo, que é rico e vocacionado, porém desenvolvido com os recursos próprios, necessitaria apenas de um “empurrãozinho” dos governos para se tornar na grande metrópole do sertão, coisa que Glória jamais conseguiu mesmo com todas as benesses recebidas.
Seria preciso, pois, dividir para multiplicar. A bem dizer, se estes ou outros governantes quiserem realmente diminuir a pobreza dos sertanejos e minimizar os problemas causados pelas estiagens, um passo primordial é investir na descentralização dos órgãos que prestam os serviços acima citados, de modo que cada município possa preparar-se estruturalmente para recebê-los, aumentando o emprego, a renda, dinamizando o comércio e a indústria e garantindo uma melhor qualidade de vida para todos. Seria simplesmente ensinar a pescar, sem precisar dar o peixe como esmola, como gostam de fazer.



Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com

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