SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



domingo, 16 de setembro de 2018

Palavra Solta - Seu Cirineu e seu chapéu que voa



*Rangel Alves da Costa


Seu Cirineu tem um chapéu que voa. Não tema asas, não é movido a dispositivo que o faça voar, mas voa o chapéu de Seu Cirineu. O velho sequer sabe por que assim acontece. Na verdade, ele nem sabe se o seu chapéu voa. Mas sempre acontece ao entardecer quando o velho sai à malhada de sua casa, lá nos confins do fim do mundo, e se põe a imaginar a vida e a pensar em tudo. Viúvo, solitário, diz a si mesmo que ainda tem forças até pra voar. E também pra fazer peraltices. Por isso mesmo que quando está ali na malhada, distante de olhas forasteiros, ele de repente corre, de repente pula, de repente brinca feito uma criança. E quanto mais o vento sopra mais ele pula, quer dar cambalhotas. E é quando seu chapéu voa. Sai de sua cabeça, toma os ares, esvoaça e vai voando. E sem chapéu, o menino-velho vai fazendo suas traquinagens de virar-mundo de cabeça pra baixo. Quando se cansa de tudo, de tanto reviver e tanto brincar, retoma sua idade, sua existência, sua real situação. E então chora. Chora muito. As lágrimas nunca caem ao chão, mas sobre o chapéu que já pousou como mão acolhedora daquela tristeza.


Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

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