Não me recordo bem o período, mas creio que
aconteceu pelos idos dos anos 80 em Poço Redondo, no sertão sergipano. De
repente, apareceu pelos rincões sertanejos sergipanos um estranho, misterioso e
instigante forasteiro, mais conhecido como João da Bicha.
Há algumas versões, contudo, dando conta que
desde os anos 60 o misterioso homem já andejava pelos sertões sergipanos.
Situei os anos 80 como marco pelo fato de que foi a partir desse período que o
mesmo se fixou na cidade de Poço Redondo e na casinha a seguir mencionada.
Como dito, conhecido como João da Bicha. E
talvez esse nome por uma ferida que tinha numa das pernas e que nunca sarava,
ainda que o mesmo se prontificasse, pelo uso de ervas medicinais e outros
meios, a curar feridas nos outros.
Moreno de pele escurecida, de altura mediana,
magro, caminhando compassadamente pelo problema na perna, de vez em quando
levando um chapéu panamá e vestindo de preferência o branco.
Alagoano ou pernambucano, não lembro bem, mas
a verdade é que foi se arranchando na cidade de Poço Redondo. Trazia consigo
somente uma velha mala e outros pertences de seus afazeres no dia a dia.
Encontrou uma velha casa desocupada e sem portas na antiga Praça Arnaldo Rollemberg Garcez (Praça Eudócia) e a tornou como moradia. Seu viver na casinha se resumia a uma saleta onde deixava seus apetrechos num canto e dormia geralmente numa esteira de chão.
Não demorou muito e o forasteiro começou a
mostrar seus dotes, de mandingueiro e de bebedor de cachaça. Logo se espalhou
pela cidade que João da Bicha era rezador de mão cheia, passando o ramo pra
qualquer coisa e aporrinhação espiritual, como feiticeiro dos bons.
E foi assim que os interessados na resolução
de problemas do corpo, da alma e do coração, começaram a formar grande
clientela para o benzedor e mandingueiro. Gente que desejava acorrentar o
coração alheio, mulher querendo desfazer o casamento de homem, gente querendo
apenas fazer maldade com o próximo, todo tipo de safadeza.
Essas pessoas geralmente entravam pelos
fundos da casa para não despertar atenção do que ali iam fazer. O homem fez
fama e enlaçou e desenlaçou muito nó, ao menos para aqueles que acreditavam em
feitiçarias e coisas tais.
Mas outras pessoas iam ali apenas para serem
rezadas e afastar pesos ruins do corpo. Certa feita, de tanto benzer, rezar e
fazer secar ramos e mais ramos de uma mulher, João da Bicha chegou à conclusão
que o problema dela não era de reza nem benzimento, mas de deixar de safadeza.
A mulher começou a chorar e acabou
confessando que não era flor que se cheirasse, e saiu de lá prometendo nunca
mais falar mal dos outros, viver espalhando fofoca e nem dar em cima de homem
casado. Mas logo a fama de João da Bicha começou a ser atrapalhada pelo seu
vício na cachaça.
De repente, outra coisa não fazia senão
beber, passando dias e noites bebendo cachaça no seu canto imundo de chão.
Quando a fase passava, então se banhava, vestia roupa branca, colocava chapéu,
e saía pela cidade, mas sua direção acabava sempre sendo um bar, onde tudo
novamente começava.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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