SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



segunda-feira, 4 de setembro de 2017

Palavra Solta - chá das cinco


*Rangel Alves da Costa


Chá das cinco e das saudades. Uma varanda fresca, um jardim adiante, um silêncio de paz perfumado pelas flores da estação. Um vento leve soprando pelas toalhas rendadas, uma doce poesia pelo ar. Cadeiras ao redor de uma mesinha, um piano que parece tocar sozinho. A velha senhora se aproxima e senta numa cadeira. Seus olhos passeiam pelos arredores, encontram a rosa e o jasmim, o canteiro vasto, as folhas caídas e ainda não recolhidas. Um quadro poético, uma moldura perfeita. Mas tudo de tristeza e de solidão. Logo uma mocinha chega trazendo o chá e as xícaras, também bolinhos e bolachas de goma. Coloca tudo na mesinha e depois se retira. A velha senhora, parecendo ausente, apenas mira adiante. Seus olhos marejam entristecidos. Nenhuma daquelas velhas amigas chegará para o chá das cinco. Ela é a única sobreviva daquelas que ao entardecer ali se reuniam para as relembranças e as nostalgias. O sol vai se pondo, as cores do dia avermelham. A noite chega e a velha senhora ali sentada, impassível, inerte, apenas mirando adiante, sem tocar numa xícara, sem se servir de nada. As amigas não vieram, mas já estão partindo. A velha senhora quer ir junto delas. Mas não, diz uma. O seu chá das cinco ainda não terminou, diz outra. Quem sabe um dia todas nós nos reunimos para uma xícara de eternidade e um bolinho de céu, ainda diz outra. E partem. E a velha senhora, falando sozinha, pede uma flor da noite. Mas só há flor de lágrimas.


Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

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