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quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

NO REINO DO REI MENINO – V

NO REINO DO REI MENINO – V

Rangel Alves da Costa*


Não obstante os muitos problemas que o rei teria que resolver, a chegada daquele escrito às suas mãos constituiu-se num verdadeiro drama. Acreditava em presságios, superstições, mistérios. Ademais, o momento de dificuldades que o reino passava fazia aumentar ainda mais o seu temor. No seu pensamento, bastava fazer uma simples relação entre os termos “um reino fragilizado”, “um rei amedrontado”, “surgirá um menino para salvar”, “o rei nasceu” e “o reinado poderá morrer”, para se ter a noção da imensa gravidade da situação. Se antes dessa novidade pressagiosa o reino já estava a perigo, agora é que tudo se complicaria mais ainda, pensava temerosamente o rei.
Conhecedora de toda aquela realidade, mesmo assim a esposa real não deixou transparecer nenhuma preocupação a mais. Era forte, e tal característica era plenamente visível nas suas ações, sempre calma, cautelosa e segura, mesmo que por dentro estivesse desmoronando. Disse ao rei que seria de bom alvitre que ouvissem alguém sobre aquela situação, mas para tal o soberano teria que expor toda a realidade do reino, afirmar dos seus temores com relação à mensagem encontrada e, o que era de suma importância, indagar sobre o que motivaria a citação do seu filho naquela mensagem e a sua colocação como suposto salvador do reino.
O rei acatou as palavras da esposa. Ele mesmo já havia pensado em buscar aconselhamento sobre o caso. Mas qual seria, neste momento, a pessoa mais indicada para compartilhar com o casal todo aquele emaranhado de fatos e coisas? O escolhido não foi outro senão Bernal, um ainda jovem e humilde servidor da família real, mas cujo conhecimento aprofundado dos elementos enigmáticos da vida, dos mistérios e das coisas indecifráveis, possibilitaria, ao menos, entender melhor aquilo tudo.
De fato, Bernal não trazia consigo somente poderes mágicos elevados, e até sobrenaturais, como alguns diziam, mas sim um poder superior de interferir no curso normal da realidade. Era uma herança familiar, uma genética sobrenatural nas suas veias. Desse modo, não era à toa que lhe chamavam feiticeiro do bem, pois sempre que teve que demonstrar suas habilidades – através da manipulação de forças para obtenção de fenômenos irrealizáveis por pessoas comuns, da utilização de rituais e processos mágicos para lidar com o presente e conhecer o futuro e da utilização de amuletos e talismãs para a obtenção dos efeitos desejados – sempre o fez em nome de boas causas, objetivando algo que fosse de utilidade.
- Meu rei, minha rainha, ficarei grato por toda vida em poder ajudá-los, mas quem sou eu, pequeno filho do dragão, para dar uma posição em assunto tão melindroso. Mas fiquem sabendo de uma coisa e prestem atenção no que vou dizer. As estrelas há algum tempo que não iluminam mais o reino com a luz que ele tanto necessita; os deuses da fortuna, das colheitas e do progresso parecem que estão fazendo descaso para conosco; somente um deus passou a fazer moradia aqui, que foi o da sorte, mas ainda não está agindo com os seus plenos poderes. Falo dos deuses que povoam a nossa mente e não do Deus que povoa a nossa fé. Este sempre age com exatidão, e se estamos passando por dificuldades é porque há um tempo para todas as coisas, como diz o Eclesiastes do livro bíblico. Sei e sinto que a situação não é das mais positivas. Quando entreguei aquele escrito a Vossa Majestade minha aflição maior não foi pelo que continha a mensagem, mas da forma como chegou até o reino e da impossibilidade de poder decifrar de onde ela é proveniente. Que veio de uma força poderosa não tenham dúvidas. Lembrem que as mensagens não foram escritas ao mesmo tempo, mas primeiro uma, a que foi encontrada pelo velho, e depois outra, surgida pelos ares. Mas a verdade é que nos chegou completa e de um modo que ainda não podemos decifrar bem. Mas temos, mesmo que isto possa causar temor e transtornos, que acreditar na mensagem, pois o mistério só deixa de ser mistério quando descobrimos a sua verdade. E a única verdade que temos agora é que temos de trabalhar com maior afinco ainda para resolver o que humanamente possamos fazer, que é trazer novamente a fartura e o sossego para o reino, e esperar que os mistérios se resolvam com o aparecimento dos bons sinais...
- E sobre o nosso filho, por que ele é citado nos escritos? – Perguntou a rainha.
E Bernal, o feiticeiro do bem, prontamente respondeu:
- Ele será nosso rei e salvará nosso reino, está escrito e assim será. E isto acontecerá muito mais rapidamente do que possa predizer o maior dos magos, com todas as armas da magia.


continua...



Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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