*Rangel Alves da Costa
O barro, o velho barro da casa antiga, da
casa velha, parece ser livro aberto querendo ser lido. A telha, a telha
carcomida da velha casa, parece ser letra querendo ser lida. A porta e a
janela, a porta e a janela da casa de barro e cipó, parecem ser as palavras
ecoando de lá de dentro. E eu, eu que pouco sei ler do passado, contento-me em
prostrar-me em sua viga e pedir que o tempo venha no tempo para me ensinar. E
vem. Chega uma folha seca, velha, carcomida da estação. E vem. Chega uma poeira
soprada no vento, chega uma canção de pó, de restos antigos e amarelados. Os
olhos miram a estrada longa. O caminho vai estreitando, estreitando, até sumir
lá longe. Ninguém aparece. Ouço vozes, mas vozes de ninguém. Ali na casa velha
só mora a idade, os anos, o passado, os restos, os tempos idos. Mas ouço uma
voz. Ouço vozes. E dizendo que o café está pronto, chamando a meninada para
entrar em casa porque vai chover, dizendo que vá logo juntar lenha para o dia
seguinte. Um relincho, um cavalo que chega. Tudo ouço. Ouço tudo, mas não há
ninguém. Depois me despeço das vozes, do barro da casa, dos restos caídos, da
memória antiga. E sigo adiante sem olhar pra trás. Mas levo a velha casa
comigo. Em mim, dentro de mim. E o que sou, e o que somos? O que somos senão
uma casa velha que o tempo cuidará de tornar em pó.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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