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A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



quinta-feira, 27 de agosto de 2015

CANTADA DE MULHER (OU QUANDO ELAS ATACAM)


Rangel Alves da Costa*


Eis o princípio da igualdade entre os sexos levado a efeito. Não é mais somente do homem a iniciativa de flertar, galantear, paquerar a mulher. O que se mantinha enraizado como verdadeira cultura amorosa, vem se mostrando com feição até mesmo inesperada ante uma sociedade ainda com ranços conservadores. Fato é que hoje em dia – e cada vez mais - elas, as mulheres, também paqueram, dão em cima dos homens, chamam para si a expressão de um desejo que se mantinha escondido.
Desde muito que tenho conhecimento daquelas mulheres de mais idade, também chamadas coroas, adentrando na selva masculina em busca de presa. A prática, costumeira e conhecida demais, consistia em frequentar sozinhas os bares e outros ambientes onde homens jovens e descomprometidos costumam bebericar. Chegavam, estacionavam seus carros logo adiante, de modo premeditamente visível, e pediam um drinque enquanto seus olhos começavam a passear. Dificilmente saíam de tais ambientes sem uma companhia para um instante de entrega carnal.
Não se tratava de prostituição, pois a presa era atraída apenas para uma aventura noturna, sem paga nem recebimento, a não ser dos prazeres consequentes da investida. Apenas uma mulher solteira e solitária que resolvia ir atrás da fruição de seus instintos. Ora, já não estava com idade de namoricos, de sonhos adolescentes, mas tão somente de ficar por um instante, de curtir as casualidades que a noite oferece. Só havia um problema nisso tudo: se ela gostasse do homem então a coisa desandava de tal modo que virava paixão e perseguição.
Situações assim sempre existiram, mas o costume prevalecente na sociedade era de que somente ao homem cabia flertar a mulher. Por mais que ela desejasse, não era visto como algo respeitoso que manifestasse seus desejos perante o homem. Consequência disso eram mocinhas entristecidas pelas janelas, esperando seus príncipes encantados passar para os suspiros da alma e o desalento do coração. Era socialmente inaceitável que desse um psiu, que fizesse um aceno diferenciado, que piscasse o olho naquela intencionalidade tão conhecida, que desse conhecimento ao homem de seu amoroso martírio.
Já o homem sempre pôde tudo nesta seara. Basta determinada mulher passar, com características corporais e físicas que aticem sua volúpia, e logo estará lançando aquele olhar que tira a roupa e a possui ali mesmo. Dá psiu, chama de boazuda, de gostosa, ou simplesmente se comporta de tal modo que quaisquer palavras seriam desnecessárias. Comumente a mulher passa e o olhar continua fixo acompanhando seu andar, como se aquele traseiro fosse algo muito além que uma bunda.
Mas se, no âmbito biológico, os instintos, os desejos e as vontades, não se diferenciam entre macho e fêmea, então por que seriam diferentes no âmbito comportamental? Simplesmente pelo conservadorismo que agora vem sucumbindo de vez no reino das presas e predadores. Atualmente também a mulher, e não acentuadamente o homem, está tomando a iniciativa pelas paqueras, pelas cantadas, pelas buscas amorosas. E tudo consequência de uma juventude feminina que se cansou de ser apenas a escolhida. Agora vai em cima sem rodeios nem meias palavras.
Neste sentido, presenciei um fato interessante alguns dias atrás. Eu estava numa festa no interior sergipano quando ouvi uma mocinha praticamente chamando um jovem aos “finalmentes”. O rapaz passou e ela, ainda diante dele, não mediu palavras: “Eita, isso é que é homem bonito e gostoso. Muita areia pro meu caminhãozinho...”. Ele passou, e surpreendido apenas sorriu timidamente. E ela continuou suspirando, com um olhar de procura e de esperança.
Não sei se depois ele retornou. Acho que não. Havia mulher demais querendo areia pro seu caminhãozinho.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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