SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

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quarta-feira, 9 de setembro de 2015

O SOL DE SOLANGE


Rangel Alves da Costa*


O sol possui extensa simbologia. É renascimento e transformação, é fortalecimento espiritual e aquecimento da alma, é iluminação e conquista. Todo mundo quer encontrar o sol e tê-lo como premissa maior da liberdade e da existência.
Igual a todas as pessoas, Solange também queria um sol. Necessitava de sua luz para reaprender a viver, para conquistar a liberdade do coração, para poder abrir a janela e de braços abertos cantar a alegria da vida.
Lindo, imenso e radiante, era o sol de Solange. Ao menos no desejo e na imaginação, pois de outra forma jamais era avistado o tão esperado clarão do dia.
Solange queria um sol, mas nunca resplandecia o sol de Solange. Por quê? Ao invés de se manter de olhos abertos, límpidos e sorridentes, ela só olhava pra cima com olhos nublados.
Tentando avistar o sol de olhos nublados, chorosos, lacrimejantes, ao invés de encontrar o azul iluminado sempre se deparava com horizontes escurecidos, espaços nublados e instantes tempestuosos.
O sol de Solange vivia entre nuvens, ainda que brilhoso e festeiro lá em cima. O sol de Solange vivia escurecido, ainda que mais afogueado que labareda. O sol de Solange vivia na penumbra eterna, ainda que alimentando a vida com sua luz.
Não havia muita diferença entre a noite de negrume fechado e o sol de Solange. O céu sem noite de lua ou o dia sem brilho de sol era tudo igual. Solange só não fazia chover porque já avistava o mundo envolto em tempestades.
Que terrível situação a de Solange, pois querendo avistar o sol e jamais conseguindo. Não tinha problemas de visão nem qualquer outra enfermidade que a impedisse de se manter com olhos bem abertos. Mas sua angústia a tudo embaçava.
Não só angústia como uma enxurrada de sofrimentos. Lacrimejantes, os olhos mais pareciam janelas gotejadas de pingos de chuva. Encharcados de lembranças e recordações, desejos e impossibilidades, os olhos se transformava num véu de desesperança. E não havia sol que pudesse ser avistado.
Quantas pessoas existem como Solange? Quantos seres simplesmente não conseguem fruir do brilho resplandecente do sol? Quantos olhos continuam avistando nuvens escurecidas e tempos nebulosos em plena luz do dia? Quantas pessoas desejam avistar o mesmo sol de Solange?
O sol de Solange e o sol de muitos, sempre escondido. O sol de Solange e a impossibilidade de tantos de reencontrá-lo a cada amanhecer. O sol de Solange e a borrasca tempestuosa impedindo de avistar além das tormentas da alma.
Jamais avistará a grandeza do sol o olhar que já mira o alto tomado de sombras. Jamais encontrará os raios do sol o olhar que nada avista além da escurecida paisagem da angústia e da aflição. Jamais enxergará a beleza da manhã, do dia e do entardecer, o olhar que nunca sai das sombras escurecidas.
Quem abre uma janela para o entristecimento não encontra qualquer ânimo para o encantamento com a luz do dia. Quem se debruça na janela do padecimento sequer sente o calor do sol ou a sua força alimentando a alma. Quem nega a importância do sol ou o desconhece por não conseguir avistá-lo, certamente nem a lua poderá encontrar.
O que faz a alma esconder o sol, o que faz o espírito esconder o sol, o que faz o ser desconhecer o sol, o que faz a vida renegar todo sol? Talvez a falta de coragem para abrir a janela já de olhos abertos. Sem lágrimas, sem tristeza, sem nebulosidade em tudo.
Assim que Solange jogar fora o seu lenço encharcado e fizer da janela uma paisagem de vida, logo sentirá o calor que se aproxima e lhe invade. E ao olhar para o alto e sentir-se abraçada pela imensa luz, então sentirá que a felicidade também é um raio de sol.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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