SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Palavra Solta: balança lembrança, balança cadeira...


Rangel Alves da Costa*


Não sei se já perceberam, mas a cadeira de balanço possui uma profunda significação. Sua simbologia é tamanha que logo remonta a recordação, a tempos idos, a avôs e avós, a velhas senhoras se embalando rente ao umbral da janela ou mesmo debaixo dos sombreados dos arvoredos lá fora. Sei de muitas histórias sobre cadeiras de balanço e seus assentos. O Velho Titonho colocava a sua na calçada, lançava mão de canivete e de palha de milho, aprontava um cigarro de fumo e começava a dar baforada pelo ar. Em seguida falava sozinho a se danar. Dizia que homem mesmo era Getúlio, que ainda ia dar o troco ao que fizeram com Juscelino, que havia sido ele quem havia aconselhado a não colocarem camisa-de-força em Jânio, mas o homem era maluco mesmo. Já a Velha Florzinha tinha um procedimento todo especial quando queria chorar relembrando o passado. Mandava que o neto colocasse a cadeira embaixo do tamarineiro da malhada e depois se espalhava toda para pensar na vida. Pensava na vida sim, mas não nessa. Então começava a relembrar de seus defuntos, de seus antepassados, de um tempo já amarelecido e sem uso. A cada pensamento uma lágrima, a cada feição que surgia um rio correndo pela face enrugada. A noite caía em ela ainda navegando num rio de tristezas sem fim. Noutra casa, numa sala escura, a cadeira de balanço balançava sozinha. Desde muito que sua dona não sentava mais ali. Havia morrido naquele mesmo local e enquanto contava os pingos de chuva que caiam lá fora. Durante o clarão do dia a cadeira permanecia estática, parada, mas quando a noite caía então ela começava a se embalar lentamente. E sozinha ainda vai embalando o mistério da vida e da morte.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

Nenhum comentário: