SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



domingo, 18 de setembro de 2016

POÇO REDONDO - MEMÓRIAS


*Rangel Alves da Costa


Estou pensando em publicar - talvez ao final do ano e para presentear meus conterrâneos - um livro das memórias poço-redondenses que de vez em quando escrevo aqui. Já tenho até o título em mente: “Poço Redondo - Memórias”.
Importante que tal publicação seja feita por dois motivos principais. O primeiro por que as pessoas mais jovens precisam conhecer um pouco mais de sua história, de seu passado, daqueles cotidianos singelos e tão importantes na formação cultural do lugar. Em segundo, por que tenho um compromisso comigo mesmo que assim seja feito. É promessa feita a mim mesmo que preciso retribuir ao meu berço de nascimento o que de melhor ele me proporcionou na vida: ter nascido no seu chão, ser seu filho!
Mas outra coisa se impõe como necessidade. Não me incomodo se digam que tanto gosto de velharias, de coisas antigas, de coisas até sem importância ao presente. Também não me incomodo se digam que insisto em promover a cultura e a história se a juventude não tem a mínima preocupação com o ontem. Tudo o que faço é por amar o que faço. Jamais será sem motivo meu constante diálogo com os mais velhos, minhas visitas aos lugarejos distantes, meu prazer em compartilhar saberes com aqueles que são verdadeiros livros. Livros matutos, sertanejos, de sabedorias infinitas.
Quando, alguns dias atrás, eu aqui publiquei retratos de Curralinho, seus casarões ainda avistados e outros já em escombros, não o fiz somente porque gosto de registrar em fotografia minhas andanças. Não, o fiz exatamente para que o povo tome conhecimento daquela realidade. E de uma realidade que é história, que é cultura. Do mesmo modo quando publico retratos dos escombros presentes em Poço de Cima e daquelas velhas moradias de cipó e barro ainda sustentadas pelo desejo do tempo.
O livro pretendido será, assim, como um baú antigo e aberto perante todos. Muitos se reconhecem no seu conteúdo, se avistam nas suas histórias, mas outros não. E é a estes que quero chegar, de modo que também se reconheçam enquanto raízes brotadas de gerações a gerações. E será um livro diferente daqueles já publicados sobre a história de Poço Redondo, sendo um de autoria de Alcino e outro meu, pois neste não haverá compromisso com o percurso histórico, mas tão somente relatar fatos, causos, proseados e acontecidos.
E acontecidos que continuo buscando com avidez. Hoje, por exemplo, ao avistar um retrato do Seu Adelaido, já na altura de seus 110 anos, porém ainda forte e de boa memória, logo senti necessidade de encontrá-lo com brevidade. Eu já tinha ouvido falar sobre ele, sua sabedoria e seu “conhecimento de muitos mistérios além de nosso alcance”, e até Doutor de Iolanda já havia me despertado sobre a importância de se conhecer melhor sobre esse homem de fundamental importância na história Poço Redondo.
Também avistei o retrato de João de Laura. Ou irei beber na sabedoria desses sertanejos de pujantes raízes ou pouco acrescentarei ao já conhecido. Não só Seu Adelaido como João de Laura, mas muitos outros que ainda estão entre nós e pouco são valorizados não só nas suas importâncias de sertanejos como de seres humanos já cicatrizados de luta. É que o tempo de vez em quando se nega a nos dar a chave de todas as portas e de tudo o que temos a fazer, mas sei que tenho ir à porta de cada um. E que bom dizer “oi de casa” e ouvir lá de dentro “oi de fora”.
Hoje eu ia contar outra história, porém vou deixar pra depois. Nem aquela quando João Pinguinho namorou com a mulher do farmacêutico e depois fugiu com a dita, deixando a cidade em polvorosa e o coitado do corneado sem saber o que fazer. Também nem aquela dando conta que foi a então lavadeira Mariá a inspiração para um dos maiores sucessos de Messias Holanda: “Pra onde vai com essa trouxona de roupa Mariá, na cacimba só tem água pra beber. Pouca água deixa a roupa mal lavada Mariá. Lavar roupa também tem o que aprender...”.
Com efeito, dizem que a letra foi feita quando Messias Holanda chegou a Poço Redondo, nos anos 70, para um grande show sertanejo que reuniu nada menos que doze renomados artistas, dentre os quais Elino Julião, Messias Holanda, João do Pife, Clemilda e Gérson Filho, Marinês, Pedro Sertanejo e muitos outros. O prefeito era Alcino, e foi ao lado deste que Messias Holanda conheceu a lavadeira Mariá, que ia passando com trouxa de roupa na cabeça.


Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

Nenhum comentário: