SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



sábado, 11 de setembro de 2010

SENTIMENTOS (Crônica)

SENTIMENTOS

Rangel Alves da Costa*


A pedra tem sentimento, a névoa tem sentimento, a onda tem sentimento, a espada tem sentimento, objetos, coisas, formas e estruturas têm sentimentos. Alguém dúvida do sentimento da noite, da lua, da lágrima, da chuva, da tarde, da manhã, do olhar? Minha única dúvida é se o homem tem sentimentos.
Quando a mocinha não vai logo cedinho dar bom dia às suas plantas e flores elas ficam entristecidas, sem cor, sem vida, murchando; quando o dono deixa de fazer o carinho usual no seu animal de estimação ele fica triste e cabisbaixo pelos cantos, muitos chegam mesmo a chorar, latir, grunhir, morder; uma casa acostumada a viver iluminada, com janelas abertas e o sol e a lua se espalhando pelos cantos, assim que se vê fechada passa a ter um ar sombrio, de medo e de abandono; a grama do jardim cresce de qualquer jeito, mas se o jardineiro quiser maltratá-la irá ter muito mais trabalho na sua limpeza. Como visto, tudo na vida tem sentimentos. Minha única dúvida é com relação ao homem.
Dizem que sentimento é a disposição mental para acolher, cativar, negar ou rejeitar; é a manifestação de acolhimento ou rejeição que comanda os seres perante determinadas situações; é a sensação causada por uma circunstância ou consequencia num dado momento. É, enfim, uma decisão ou disposição mental que alguém ou algo toma em sua mente ou seu interior, ou alma, ou espírito, a respeito de outrem ou algo.
Numa concepção mais intimista, conceituo sentimento como o compromisso do coração diante daquilo que os olhos veem. Seria o básico existente e preexistente em todos os seres, pois surge automaticamente diante de cada situação vivenciada. Coisas existem que faz sentir estranheza, outras causam emoção e ainda outras desafiam os limites entre o sentir e a dor.
O que não se pode ou deve esquecer é que o sentimento só é possível naquele ser que tem um compromisso consigo mesmo e com o outro, até com o estranho. Nada que ignore o próprio sentir poderá sentir pelo outro; nada que não se auto-reflita poderá entender o outro; nada que não procure entender e sentir o que ocorre dentro de si poderá ao menos imaginar o que ocorre com o outro. É por isso que o sentimento é questionável perante o ser humano.
Ora, é mais que usual se ouvir por aí que meninos abandonados embaixo de marquises, esmolando por todos os cruzamentos ou usando drogas em qualquer lugar são coisas de cortar coração. O parente distante de um amigo faleceu e na primeira vez que encontra esse amigo é como se a própria vida tivesse caído com tantos pêsames e lamentações. As criancinhas africanas com aqueles olhos profundos de fome e abandono e pessoas sentadas no sofá com pipocas e refrigerantes lamentando a sorte desses inocentes.
Pessoas que vivem vomitando sentimentos éticos perante os outros, dizendo que se sentem envergonhadas e revoltadas com a política e os políticos, mas que são capazes de tirar a vida do outro se disser que o seu candidato é gordo ou feio. Pessoas falsas, frias, fingidas, personagens delas próprias na comédia da vida, são as que mais dizem que têm sentimentos.
Não existe sentimento no ser humano porque este é falso por natureza. É falso consigo mesmo e muito mais com o outro. Acha que é bonito ser demagogo e vai fazendo crescer a fila dos mentirosos, dos humanistas do terror e dos chorosos de plantão. E nunca é demais perguntar quantos seres humanos possuem o compromisso sério e verdadeiro de querer mudar a situação daquilo que por um intante lhe causou estranheza? Poucos, muito poucos.
Contudo, não poderia deixar de citar três exemplos de sentimentos verdadeiros e que merecem aplausos. Quando a socialyte Vera Loyola trata seu bichinho de estimação com todas as preciosidades do mundo e tanto faz que o bicho homem que lhe estenda a mão morra de fome, está demonstrando ter sentimento verdadeiro. Quando o General Figueiredo disse que gostava mais do cheiro do seu cavalo do que de gente, estava sendo extremamente verdadeiro. Quem finge não conhecer que a candidata Dilma é pior do que o mais malvado dos carrascos, mais insensível do que torturador e mais ditadora do que qualquer Hitler é porque está sendo verdadeiro.
Ora, mas esses três exemplos citados não tratam de pessoas. Nem Vera Loyola, nem Figueiredo nem quem vota em Dilma podem ser consideradas pessoas. Estes são exemplos de sentimentos verdadeiros. Mas o ser humano mesmo não tem sentimento.




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

Nenhum comentário: