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segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

ANA BAILUNE: SOBRE A VELHICE E RECORDAÇÕES FAMILIARES


Escrevi o texto intitulado “Ainda sobre a velhice”, e em comentário gentil e precioso, a querida Ana Bailune logo sentenciou: Um lindo texto! Então, no mesmo espaço, peço permissão à escritora petropolitana para publicar, mesmo sem sua anterior autorização, suas considerações acerca da velhice e recordações familiares. Eis:
“Um lindo texto! Me fez lembrar de muitas coisas, e acho que é isso que os bons textos fazem.
Eu tinha medo da velhice, da degeneração do corpo. Fui uma moça bonita, e a ideia de envelhecer e perder a beleza sempre me assustou. Mas chegou a hora, e então percebi que a velhice é uma fase. Talvez não a melhor delas, mas pode ser interessante também. Hoje, quando penso na velhice, lembro-me dos braços enrugadinhos da minha mãe se abrindo quando ela chegava à janela aqui de casa e olhando as montanhas, exclamava: "Mas olha só que coisa linda! Você deve agradecer todos os dias, pois mora em um pedacinho do paraíso!" E me lembro do rosto dela, e das pulseiras e aneizinhos que usava, sempre muito arrumada, e nunca deixava de comprar coisas novas e passear muito. Gostava de dançar e viajar.
E acima de tudo, tornou-se muito tolerante. Quando minha irmã brigava com ela, e dizia coisas que eu sei que a deixavam magoada, ela suspirava fundo, arrumava a bolsinha e ia passar uns dias fora. Depois, voltava. Não guardava mágoa.
E minha irmã me ligava nessas ocasiões, me pedindo opinião sobre o que fazer, e eu ligava para minha mãe e via que as duas enxergavam a mesma situação de maneira muito diferente. minha irmã cheia de impaciência (sinto que até de remorso), e ela, conformada, mudando de assunto, querendo falar do tempo, do programa de TV, do novo paquera no clube onde dançava.
Se ela ficava magoada, nunca me disse.
Acho que quando a velhice é aceita, ela traz essa paz de espírito, pois mostra que estar perto da hora da morte ao invés de angústia, traz alívio.
Por isso, enquanto todo mundo chorava amargamente a morte de meu sobrinho aos 24 anos, minha mãe, dizia: ‘É... mas a vida é assim. a vida continua... de nada adianta ficar triste’. E tem gente que pensava que ela era fria”.