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A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Palavra Solta: vida de calango


Rangel Alves da Costa*


O calango é um dos bichos mais resistentes do mundo, não há como duvidar. Quando nascido na ambientação sertaneja, onde o chão abrasado e o fogaréu de mil sóis descem famintos sobre a terra e seus seres, então é que se mostra mesmo a resistência do pequeno lagarto matuto. Quando a seca tudo devorou, quando não há mais sombra, loca de pedra escondida ou barreiro de molhação, o bicho ainda assim é encontrado, num alvoroço danado, de canto a outro. Em meio à devastação, às pedras pontudas e aos espinhos cortantes, então ele surge correndo, veloz, olhando de lado a lado, buscando o melhor caminho para fugir do braseiro. Sobre na pedra e fica balançando a cabeça, num balançar sem parar. Dizem que seus olhos tanto avistam o que está à frente como o que está atrás, por isso mesmo a contínua observação do que acontece pelos arredores. O medo maior é uma pedra jogada por um moleque caçador, uma arapuca armada debaixo da pedra grande, qualquer coisa que lhe aprisione e passe a servir de comida para quem já não tem sequer perna de preá. Mas tão forte e resistente é que some em correria quando seu rabo é ferido. O rabo fica pra trás e ele some em correria. O rabo, como se tivesse vida própria, vai novamente crescendo enquanto ele sobre e desce da pedra grande, em constante vigília, esperando dias melhores em meio ao sofrimento. Assim é o calango, assim um pedaço do imenso sertão.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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