SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



sexta-feira, 20 de abril de 2018

Palavra Solta - sertão, meu sertão...



*Rangel Alves da Costa


Cadê meu chapéu de couro, meu alforje e meu gibão? leve essa caneta dourada e esse papel feio e de tanta letra e me traga meu aió de cipó trançado e o meu embornal e pergunte a Zefinha se vai botar baião-de-dois no fogão. Cadê minha lua tão sertaneja e meu sol tão chamejante? Leve esse sapato brilhoso e esse terno vaidoso e egoísta e me traga uma cuia de araçá e um punhado de quixaba e pergunte a Joaninha se amanhã vai quarar rouba na cacimba. Cadê meu tempo, minha vida, meu passo naquela estrada? Olho a ventania no varal e me pergunto se a vida é assim também. As craibeiras tardam tanto a chegar que choro a finura da catingueira. Tenho tanto medo que tudo seja assim que peço meu rosário de contas. E Bastião me vem dizendo que não há mais capim nem palma, silencio porque já ouvi de Totonho que já não há mais nada lá fora. Enquanto isso Delourdes canta uma velha canção para não chorar, mas não há quem não chore se o gado não berra e o galo não canta mais. Sofro e choro num sertão assim castigado de braseiro sobre a terra, mas ainda assim muito mais contente que viver fingindo alegria distante. Por isso deixo pra trás meu anel de doutor e toda essa minha esnobês e vou caminhar pela terra sertão de chinelo de dedo como meu pai fazia.


Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

Nenhum comentário: