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terça-feira, 7 de março de 2017

NO MUNDO DA PAZ?


*Rangel Alves da Costa


As bandeiras brancas tremulam pelos mais diversos organismos internacionais e nas sedes governamentais e de poder mundial. Pombas da paz estampam bandeiras, livros, murais e muros, enfeitam paredes, estão presentes em camisetas, em papéis timbrados e panfletos. Inúmeras são as legislações preconizando a paz como anseio mundial e determinação de convívio entre povos e nações.
Mas onde estará mesmo a paz mundial, onde será mesmo esse tão propalado mundo da paz? Somente nas utopias, nas quimeras e ilusões, torna-se possível avistar uma realidade ao menos de justiça, de dignidade, de comunhão, de fraternidade e respeito ao próximo. Contudo, as utopias foram, desde muito, desmitificadas pelas durezas do mundo real e vividamente presente entre povos e nações. Significa, pois, que o mundo da paz simplesmente não existe em lugar algum.
Os organismos internacionais e seus tratados de paz jamais conseguiram impor qualquer medida neste sentido. Os países signatários simplesmente assinam simbolicamente a aceitação e depois simplesmente colocam os considerandos e os preceitos debaixo da sola dos sapatos. Igualmente ocorre com relação ao clima, à proliferação de armas nucleares, à erradicação da miséria e da pobreza, ao fim do trabalho escravo, o respeito às minorias, dentre tantos outros, que acabam tendo pouquíssimas consequências nas suas políticas.
Mas onde estará mesmo o tal mundo da paz? Olha-se de canto a outro do planeta e o que se avista é de causar espanto e medo. Como pode haver paz num mundo onde a fome afeta e mata milhares de pessoas todos os dias, onde as epidemias mais simples de serem combatidas ainda provocam dizimações de comunidades inteiras, onde a escravização infantil e adulta ainda persiste acontecer, onde a miséria e a pobreza continuam tornando insuportável o viver em meio à falta de saneamento básico, de postos de saúde e medicamentos?
Certamente Hitler e Stalin queriam um mundo de paz para suas nações. E uma paz que somente seria possível com mortes e trucidamentos de milhões de pessoas. Os campos de concentração, as trincheiras de guerra, as perseguições, as mortes nos paredões e demais tipos de execuções, foram algumas das políticas adotadas em busca dessa paz interna e da expansão do poder perante as demais nações. Daí indagar-se: pode haver paz quando os objetivos da paz primeiro passam pela morte, pelo sangue e pelo terror?
Pacificar o mundo através da religiosidade dos povos sempre foi acreditado por muitos, porém impossível de acontecer, como bem demonstram as lutas religiosas, as guerras santas, o terrorismo fanatizado, onde a cruz e a fé são trocadas pela espada, pela arma e pelo covarde ataque. Até mesmo as Cruzadas foram reconquistar as terras santas através das armas, pelas armas foram recebidas e pelas armas tiveram seus desfechos infrutíferos. Quando expedições e exércitos cruzavam fronteiras levando à frente a cruz real, que não se imagine a ausência da sanha sangrenta no afã de conquistar.
Que paz é esta que campeia nos campos de refugiados, nos povos apátridas, nas etnias que são vistas e tratadas como asquerosas? Que paz é esta que faz uma população inteira fugir pelos mares e morrer entre as águas em busca da salvação em qualquer terra, que vitima velhos e crianças e que separa famílias inteiras? Que paz é esta que impõe toque de recolher, que sequestra jovens e adolescentes e espalha o terror por tribos e comunidades inteiras? Que paz é esta passa em facão o ódio exacerbado, que vitima qualquer um sem qualquer causa que justifique, que atrai menores para a guerra e o terrorismo?
Que paz é esta que assola o mundo africano e faz de seus pequeninos uns seres rastejantes em busca de qualquer grão, que não permite que a vida dure mais do que apenas alguns anos, que não dá esperança de hoje nem de amanhã? Que paz é esta incendeia o que encontrar, que corta cabeças, que coloca em mira desde a infância à velhice, que dizima civilizações inteiras em nome do ódio, do medo e da violência? Que paz é esta que torna nações ingovernáveis e governos em tiranos, povos em escravos e todos em busca de razão pra viver? Que paz é esta que sempre vê no outro um inimigo, que faz de qualquer um inimigo, que desconhece totalmente o ser em sua existência e dignidade?
Será este o mundo da paz? Verdadeiramente jamais será paz apenas a intencionalidade, o sonho de ter o mundo em comunhão, a esperança de que os povos se respeitem mutuamente. Não haverá paz enquanto as guerras forem tidas como mais lucrativas e os egoísmos governamentais forem mais importantes que o respeito às demais nações. Não pode haver paz no mundo onde a violência é alarmante, onde a insegurança prospera por todo lugar e onde o cidadão não se sente seguro sequer dentro do próprio lar. Não cabe a paz onde as leis são injustas e os julgadores mais injustos ainda.
Sim, talvez haja um mundo de paz. No coração daquele que teme até abrir a porta para abraçar o sol. A paz inalcançável num mundo de todas as guerras.


Escritor
Membro da Academia de Letras de Aracaju
blograngel-sertao.blogspot.com

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