SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



segunda-feira, 13 de março de 2017

Palavra Solta - Zé Aroeira e a eternidade


*Rangel Alves da Costa


Zé Aroeira é um sertanejo já passado dos noventa, mas que nem parece ter cinquenta anos. Todo dia ainda bota a mão na enxada, no facão, no enxadeco, em tudo que precisar. Ajeita cerca, limpa pastagem, planta palma, lança mão do gadanho para limpar as folhagens caídas. Acaso preciso, sobe no cavalo magro ou jumento atrevido e vai dar conta do problema na distância que for. Ainda toma uma pinguinha antes do almoço e ao entardecer, aperta o dedo na viola de pinho e cantarola uma saudade danada. Come de tudo. Não nega o sarapatel nem a carne de porco, não foge da rabada nem da feijoada. Lambe os beiços e estende a cuia querendo mais. Mas dizem que, por que conversa sozinho, está ficando broco, perdendo o juízo. Mas não. Aí está o seu segredo de eternidade. Desde a mocidade que gostava de conversar sozinho, num diálogo era como num íntimo confessionário. Depois, sem prestar atenção nas baboseiras tidas por um e outro, passou a conversar com o mato, com a água, com a terra seca, com a pedra, com o sol, com a lua. E é como os verdadeiros amigos estivessem sempre presentes para ouvir suas alegrias e seus desencantos. Por isso toda essa paz e todo esse vigor, essa invejável pujança de vida.


Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

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