*Rangel Alves da
Costa
Tudo, mas
tudo mesmo, pode ser resumido nestes três elementos: pedra, grão e pó. E a
ventania levando o pó para dizer que a pedra, por maior rochedo que tivesse
sido, de repente pouca valia terá no destino.
A pedra representa
a força, o poder, a dureza, a firmeza. A pedra é sólida, segura, forte. Do
mesmo modo é o ser humano nas suas normais capacidades de existência. Tão firme
que parece inquebrantável.
O grão, ou
a pedra que é quebrada ou partida em pedaços menores, representa a fragilidade,
a fraqueza, a inconsistência, a desestabilidade. O grão, fruto daquilo que já
foi rochedo, demonstra bem a validade daquela famosa frase: Tudo que é sólido
se desmancha no ar.
Igualmente
a pedra, de repente o ser humano começa a se fragilizar, a perder sua força e
potência, a sentir diminuída sua solidez, para se transformar apenas em pedaços
dentro de um mesmo ser. Passa a sentir mais de perto o coração, a mente, o
organismo.
O pó, a
poeira ou a partícula, representa o resto do resto do resto. O grão, com o
passar do tempo, vai se consumindo de tal modo que logo começa a se esfacelar,
a perder o resto de suas forças, a não ter forças para manter sobre si aquilo
que lhe permite existir. E então será apenas pó.
O ser
humano caminha pelo mesmo percurso, eis que possui esse mesmo destino da pedra
ao pó. A frase bíblica deixa induvidoso: Tu és pó e ao pó há de retornar. O
rochedo, a pedra intacta, nada mais é que um acúmulo de pó sedimentado. Bem
assim o homem, um acúmulo de grãos que se diluirão.
O homem é
pedra, é forte, é impávido, e tudo suporta nesta condição. Mas o tempo vai
corroendo o rochedo, a idade vai desabando a rocha, e não demora muito para que
uma junção de pedras frágeis tome o seu corpo. E a corrosão da pedra leva ao desgaste
de tudo, até que o que resta do corpo se transforme em pó.
O pó, pois,
é a metáfora de muito que há na vida: o resto, o nada, o adeus, a fragilidade
absoluta, a partida, o voo forçado, a despedida, a morte, a submissão ao querer
daquilo que nenhum valor havia sido dado noutros tempos, quando ainda era
rochedo: a ventania.
A
ventania, neste percurso da pedra ao grão, passa a significar a força oculta, a
energia do relegado, o que se manteve em silêncio até o momento do grito. A
pedra pouca importância dava à sua existência, mas ela, a ventania, continuava
passando e sentindo sua aspereza.
A pedra,
certamente por se achar indestrutível, nem percebia que a ventania levava
minúsculos grãos toda vez que por ali passava. Ao ser quebrada, repartida,
fragilizada, sentiu que a ventania se transformava em poeira depois de cada
passagem. E que o tempo se encarregaria
de entregar ao seu sopro aquilo que restou de cada grão.
Urge
indagar: quem é mais forte, quem tem mais poder, quem é mais consistente, será
o rochedo ou a ventania? Ou de outra forma perguntar: a pedra bruta não é
infinitamente mais presente e poderosa que o vento? Alguém poderia dizer que a
pedra possui existência, enquanto a ventania é apenas aparentemente percebida.
Neste
caso, logicamente que a pedra seria muito mais forte e poderosa que qualquer
ventania ou vendaval. Ainda que a força do vento chegue destruidora e vá
arrastando a pedra para longe, ainda assim esta terá a mesma força e aparência
onde for deixada.
Contudo,
ouso afirmar que as forças e as fragilidades são iguais. Nem a pedra supera a
ventania nem a ventania se sobrepõe ao rochedo. E é muito simples explicar. A
ventania some no horizonte e num caminho que não haverá mais volta, e levando
consigo o último pó daquilo que um dia foi rochedo.
E ali
também o pó do homem. Não aquele que jaz sob a terra, assim transformado de seu
rochedo, mas como metáfora de sua extrema fragilidade, de sua força de pluma em
meio a todas as forças. Principalmente as forças do tempo, da idade, dos
limites da vida.
E também o
frágil peso do ser diante da Criação. Pois tudo infinitamente pó. Tudo
eternamente na poeira do que passou. E tudo passa, tudo se transforma, do tudo
ao nada.
Eis que és
pó e ao pó haverás de tornar. Mas não significa o sumiço na poeira dos tempos,
no esquecimento na terra sob a terra. As realizações humanas não passam como o
próprio homem.
Um imenso
rochedo será avistado do pó juntado ao pó, do grão unido ao grão, pelo que o
homem fez na sua passagem terrena. E tal pedra será tão inquebrantável quanto a
própria memória.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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