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sábado, 13 de setembro de 2014

AS REPUTAÇÕES


Rangel Alves da Costa*


A reputação de um homem é o que mantém o outro de boca aberta ou fechada, já dizia o metido a sabichão Zeinha de Menelau. E dizia mais: Até mesmo o falador e mentiroso tem de esconder sua língua nos dentes antes de dizer qualquer coisa sobre pessoa de nomeada. Por mais que deseje enlamear o nome ou manchar a imagem, terá de engolir sua vontade diante da honradez e lisura já considerada até mesmo pelos desconhecidos. E assim porque pessoas existem que levam consigo um escudo contra invejas e aleivosias.
Já Totinha da Quixabeira afirmava que o nome chegando antes do homem servia pra duas coisas: ou abrir ou fechar a porta. Ninguém pode ser bem recebido se vai trazer consigo a fama do que não presta. Mas se a pessoa é respeitada pela sua postura ou reconhecida pela decência, então será chamado a entrar e festejado com água de moringa e doce de leite. E finalizava seu pensamento com um ditado que repetia sempre como de sua lavra: Quem tem o nome sujo paga preço alto ao vento pra não espalhar demais sua presença, ainda que longe esteja.
Interessantíssimo era o entendimento sobre o renome defendido por Flosina das Flores, uma prostituta que se arvorava de ser exemplo maior de reputação. Segundo ela, se reputação significa o modo como a pessoa é percebida pela sociedade, então não haveria lamaçal maior que o jogado sobre si, sobre sua honra, pois quase sempre vista como desonrada pela escolha de vida. Mas por outro lado - dizia -, se a reputação também for o reconhecimento da honestidade na conduta e da retidão nos atos praticados, então o meu pecado se transforma em santidade e passo a não dever nada nem ao mais íntegro dos seres humanos.
Difícil dizer quem está com a razão, vez que o conceito de reputação nem sempre comunga com as realidades. Com efeito, consta dos livros ser a reputação a opinião que os outros possuem acerca de determinada pessoa; é a percepção que os outros têm dos sujeitos, construída a partir de informações sobre o que são e o que fazem no seu percurso de existência; é o resultado das impressões que os indivíduos possuem sobre outros indivíduos, implicando sempre numa valorização positiva ou negativa. Em síntese, reputação é o que o outro vê em você, ainda que seu esforço seja descomunal para ser reconhecido como se acha merecedor.
Mas da opinião de Flosina das Flores pode se chegar a algumas considerações importantes. Mesmo prostituta, sem jamais negar tal condição ou esconder sua opção, ainda assim se sentia como pessoa de reputação ilibada, sem dar motivo algum para ser vista em contrário. E talvez sua atividade enquanto prostituta não interferisse em nada no seu sentimento pessoal de honradez e na normalidade de sua conduta social, e por isso mesmo pudesse ser vista como pessoa séria, respeitadora e cumpridora de suas obrigações. Contudo, pelo simples fato de ser prostituta sua desonra já estava patente perante a sociedade. E então?
Então se percorre o nem sempre claro limite entre o que a pessoa realmente é e naquilo que é transformada. São muitos os exemplos em que acusações maldosas, insinuações infundadas e fofocas acreditadas provocam danos profundos e de difícil reparação nos injustamente afetados. Do mesmo modo, são muitos os casos onde as desonras são provocadas por interesses pessoais. O problema maior é fazer com que a sociedade filtre as informações repassadas e não tenha como verdade tudo que surge acerca dos indivíduos. Ou acreditando tenha a virtude de se redimir a tempo e a contento. Mas nunca acontece assim.
Sobre a reputação já disse Sócrates, o filósofo grego, que a maneira de se conseguir boa reputação reside no esforço em ser aquilo que se deseja parecer. E esforço grande mesmo e ainda assim com a certeza de que sua fama será uma quando de sua presença e outra quando já tiver virado as costas. Infelizmente é assim que costumeiramente se observa. Dificilmente a desonra e a desonestidade são alardeadas na presença da pessoa assim havida, eis que o fingimento de aceitação e respeito é a cal cimentadora da pocilga que se vai construindo às escondidas. Assim que a pessoa dá as costas já se tornou na vileza em pessoa. Atitude sempre reprovável, porém tão costumeira quanto o verdadeiro respeito que a maioria das pessoas devota ao próximo.
Desse modo, difícil é reconhecer até onde a reputação pode incidir mesmo sobre pessoas tidas como exemplos maiores de conduta social, vez que nunca são reputadas como íntegras pelo que verdadeiramente fazem, mas pelo que os outros sentem a seu respeito. E logo se vê que não é fácil obter o justo reconhecimento num mundo envolto de invejas, concorrências pessoais, desonestidades e mentiras intencionalmente propagadas para macular imagens, desonrar pessoas, tornar imprestável aquilo que é essencialmente bom. Por depender do outro, do conceito que este cria e alardeia, mesmo o mais reputado dos homens corre o risco de cair na desgraça por uma língua ferina.
Contudo, pessoas existem cujas reputações são as mais deploráveis possíveis. Mas não pelo que são pessoalmente, enquanto indivíduos, e sim pelo que socialmente representam. O exercício de cargos e funções, bem como o status de poder e governança, são portas abertas para que verdadeiros lamaçais lhes sejam atribuídos. Porém nem sempre se perpetuam com tais máculas, vez que o próprio povo tem o dom de tornar conhecida a má reputação e depois cuidar de endeusar o enlameado. Assim ocorre na política. Depois de eleitos são tidos e havidos como o que de pior possa existir, mas sempre são endeusados quando apenas candidatos.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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