SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

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segunda-feira, 11 de abril de 2016

O BRASIL SEM DIA SEGUINTE


Rangel Alves da Costa*


É comum ter o dia seguinte como símbolo de superação, de esperança, de reconquista. Diz-se, então, que tudo amanhã será diferente, bem melhor, com novas e positivas realidades. Igualmente com relação ao amanhecer majestoso depois da noite de aflição e do dia ensolarado após momentos tempestuosos. Há sempre uma analogia entre o que de melhor virá após o que foi tão difícil de suportar. Tudo remetendo ao Eclesiastes: depois da escuridão vem a luz...
É, pois, no dia seguinte, ou na sua expectativa promissora, que reside toda a esperança. Ninguém deseja um amanhã sofrido, tormentoso, de verdadeira agonia. É comum na maioria dos seres humanos o desejo de que novas conquistas sejam alcançadas dia após dia. É a aspiração inata, ainda que a semeadura seja insuficiente para prosperar em colheita. Mas é anseio humano sempre ter o melhor. Daí a ânsia de felicidade ao abrir a janela do amanhecer, daí a expectativa de que tudo dê certo, pois já manhã do dia seguinte.
Mas as manhãs dos dias seguintes nem sempre acontecem. Ou deixaram de acontecer. Por isso mesmo que é triste viver num Brasil assim, sem dia seguinte. E não há dia seguinte porque tudo parece continuar na mesmice do caos, do absurdo, do insuportável. Os jornais chegam com as mesmas manchetes, os noticiários televisivos dão acréscimos às mesmas informações, as redes sociais e os sites informativos sempre se voltam aos mesmos temas. Quer dizer, o Brasil parece parado no tempo e ante um abismo medonho e sem saída.
Quando os dias são difíceis, de crise e desalento, comumente se lança na esperança a tábua de salvação. Surgem as palavras boas, os confortos e os alentos, e todos na perspectiva de que amanhã será outro dia, de que a janela aberta ao alvorecer mostrará uma face alvissareira, de que os caminhos adiante sejam bem mais floridos e sombreados. O ser humano em si se apega nessa esperança vindoura, nesse amanhã novo e promissor. Mas o que dizer do Brasil?
Longe dos pessimismos, mas não há como deixar de reconhecer a estrada que terminou e não se pode alcançar o outro lado por falta de ponte. Ao invés da ponte, da passagem, o abismo diante dos pés. À frente, na outra margem, o tempo novo que todos desejam alcançar, o amanhecer ensolarado por tantos tão sonhado. Como não consegue voar, ao homem, desolado e triste, outra coisa não resta a fazer senão procurar saídas dentro do próprio medo. Mas fazer o que, se todos se encontram na mesma situação e ninguém ainda encontrou passagem?
Imagine-se o Brasil como uma casa de portas e janelas fechadas, sem luz elétrica ou do sol, relegado ao breu dos tempos. E dentro da casa pessoas tristes, sufocadas, temerosas, avidamente buscando abrir os ferrolhos para encontrar saídas. Mas quanto mais lutam mais os ferros emperram pela corrosão dos desgovernos, das improbidades, das falcatruas, das ferrugens causadas pelos donos do poder, das leis e do comando da nação. É como se o povo de dentro da casa se esforçasse para sair do caos e do lado de fora outras forças agissem para a continuidade da caótica situação.
As pessoas desta casa não querem além de um pouco de luz, de ar puro para respirar, de paz e tranquilidade. Tudo tão fácil não fosse as ferrugens que emperram o país e aqueles que do lado de fora, ainda gozando da liberdade, insistem em não permitir que o povo garanta o seu destino de brasileiro. E as dificuldades do povo aumentam mais porque os escombros e os dejetos acumulados do lado de fora também impedem a passagem do povo e a entrada da luz. Somente uma fresta na telha quebrada permite imaginar que lá fora, no Brasil desejado, ainda há vida para se viver.
Lamentável que assim aconteça. Deveras muito triste que o Brasil de agora viva uma situação assim, que seja um país sufocado, aprisionado, sem saída, sem portas ou janelas que possam ser abertas na manhã seguinte. Certamente que o sol se aproxima esplendoroso, que a luz quer iluminar sobre tudo, mas há uma névoa escurecida, uma bruma espessa e enegrecida, que acaba impedindo toda luz e toda prosperidade de novamente incidir sobre a vida.
Enquanto a cerração não for dissipada e os culpados paguem por suas culpas, enquanto o nevoeiro não for amainado e os desgovernos deixem de governar, somente serão avistadas as portas e as janelas fechadas numa casa cujas pessoas desejam apenas viver. Lá fora os cães ladram espantados com os que estão libertos e se arvoram de donos das manhãs, do sol e da lua. Mas dentro da casa continuam reféns aqueles que nada fizeram para que tamanha escuridão recaísse sobre o seu mundo. É um preço injusto que se paga por terem confiado suas manhãs e seus dias seguintes àqueles que estão lá fora.
Chegará o dia - assim se espera - que as portas e as janelas serão reabertas. E a esperança maior é de que o sofrimento redunde em lição. Que nunca mais as chaves da casa sejam entregues a mãos erradas e que se aprenda o valor de se ter manhãs e dias seguintes.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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