*Rangel Alves da Costa
Falar em
pega-de-boi é dizer da valentia e galhardia do vaqueiro nordestino em cima de
cavalo bom e no encalço apressado do boi adestrado pra não se entregar, pra não
deixar ser derrubado pelo rabo.
Mas a
história disso tudo vem de longos caminhos. Na região nordestina e sertaneja,
sempre foi costumeiro a cria de gado solto. Nos tempos mais antigos, o gado era
solto numa vastidão de caatinga sem fim.
Tamanhas
eram as propriedades, os chamados latifúndios, que os rebanhos pareciam sumidos
nas “soltas” e entre mandacarus e xiquexiques, baraúnas, catingueiras e
aroeiras.
Como os
donos das grandes propriedades não iam muito além das varandas e arredores de
seu casarão ou moradia de mando, a juntada dos bichos passou a ser ofício do
vaqueiro.
Ante o
fato de que muitas propriedades não serem cercadas e os rebanhos serem criados
em conjunto com outros proprietários, escolhia-se um período para fazer as
apartações, onde vaqueiros entravam no mato para reunir os rebanhos segundo
seus donos.
Eram
verdadeiras festas, então chamadas de festas de apartação. Mas como nem todo
boi e toda vaca era fácil de ser juntado, vez que arredios e valentes demais,
então os homens pegavam seus rastros e seguiam em seus encalços.
Vaqueiros
em seus potentes cavalos vencendo os perigosos labirintos da mata para
encontrar os rebanhos desgarrados. Um atropelo danado, com cavalo brabo e boi
mais brabo ainda.
Contudo,
nem sempre se ia atrás de rebanhos, mas apenas de um ou dois animais afastados
nos grotões e escondidos catingueirentos. Os bichos saem, pastejam, vão
adiante, se escondem.
Bichos tão
valentes, atrevidos e difíceis de serem alcançados, que logo surgiram prêmios
para aqueles que conseguissem enfim encontrá-los e derrubá-los. Daí o nome de
pega-de-boi no mato.
Um nome,
aliás, que vem de vaca, aquela que cuida da vaca, que tange boiada ou junta o
rebanho no pasto ou no curral. Da vaca o vaqueiro, do vaqueiro a vaquejada. De
cavalo a cavalgada.
Diferente
da pega-de-boi no mato é a corrida de mourão, onde a corrida ao boi é feita em
locais fechados, parques de vaquejadas ou nas malhadas das fazendas.
Na corrida
de mourão, geralmente há uma um local determinado (ou faixa) demarcando até
onde o boi deve ser derrubado.
Tanto na
pega-de-boi no mato como na corrida de mourão, diversos prêmios (em dinheiro ou
troféus) são distribuídos entre os vaqueiros vencedores.
Não há que
duvidar, contudo, que nenhuma modalidade de vaqueirama é mais autêntica e
abnegada que aquela exercida pelo vaqueiro de pega-de-boi no mato. E muito mais
que o vaqueiro de corrida de mourão.
O vaqueiro
da pega-de-boi no mato não pratica seu esporte por boniteza ou simplesmente
almejando um prêmio.
O seu
troféu maior está no prazer de selar seu cavalo, colocar seu terno de couro,
paramentar-se de homem da mata, e adentrar na caatinga atrás do bicho, ou ir ao
encalço do valente desde que ele é solto soltando fumaça pelas ventas.
Sabe dos
perigos que rondam, sabe das pontas de paus e espinhos certeiros que poderá
enfrentar adiante, sabe da valentia do boi, sabe que o sangue e a dor logo lhe
poderá fazer companhia, sabe que até pode não retornar da pegada.
Sabe de
tudo isso, mas sua valentia e seu destemor não o deixam recuar. Seu objetivo
maior é alcançar o bicho, pegar no seu rabo e torcer, até que o chão se abra
com a queda do animal.
A poeira
cobrindo, as folhas espalhadas, os pés de paus retorcidos, e o vaqueiro domando
o valente. Não há prazer maior que isso. E não há vaqueiro mais autêntico e
verdadeiro que aquele da pega-de-boi no mato.
E Poço
Redondo, sertão sergipano, tem demais. Poço Redondo é celeiro maior desses
abnegados, verdadeiramente devotados à vida vaqueira. E que bom que seja assim.
A preservação de uma cultura que cheira a couro, a suor e a sertão.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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