*Rangel Alves da Costa
No último
dia 15 de agosto aconteceu a celebração maior da religiosidade de Poço Redondo,
no Alto Sertão Sergipano: Festa da Padroeira Nossa Senhora da Conceição. Ante a
igreja e seus arredores repletos à espera da procissão, eis que me pus a
imaginar quantos daqueles fiéis conheciam ao menos um pouco da história daquele
sagrado templo. Comprometi-me, então, a tecer algumas considerações.
Igreja
Matriz significa o templo mãe, o templo primeiro, o local escolhido para que os
habitantes de uma comunidade ou povoação pudessem expressar sua fé perante um
sagrado altar. Certamente que a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição de
Poço Redondo não foi a primeira igreja nascida na povoação.
Antes de
sua construção, e no mesmo local de onde agora se mostra bela e imponente, em
outra localidade mais acima já havia surgido, em meio à comunidade primeira do
Poço de Cima, a Capela de Santo Antônio, ainda nas últimas quadras do século
XIX. Contudo, tal capela, pequena e modesta, surgiu por aspirações familiares,
para os cultos e ofícios de uma comunidade profundamente católica. E mais
antiga ainda é a Igreja de Nossa Senhora da Conceição de Curralinho, vez que em
1874, quando da passagem de Antônio Conselheiro e seus seguidores pela região,
os alicerces daquele templo já estavam fincados.
Quando,
após o florescimento das muitas fazendas que circundavam a região conhecida
como Poço de Baixo e a formação de uma pequena comunidade nas beiradas do
Riacho Jacaré, então o centro vivo daquela povoação sertaneja passou a ser a
comunidade de Poço Redondo, assim denominado porque ao lado de um “poço
redondo” onde costumeiramente os criadores levavam seus magros rebanhos para
enganar a sede em épocas de seca grande.
Assim,
ante essa comunidade surgida, também a necessidade de um templo católico onde
houvesse a junção de todos os ofícios e cultos religiosos. Desse modo foi que
surgiu a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, homenageando a padroeira
escolhida da recém-surgida povoação, ainda que logo ao lado, no Poço de Cima, o
padroeiro continuasse sendo Santo Antônio, como acontece até os dias atuais.
A
denominação de matriz somente surgiu após a emancipação política local, em
1953, e a presença de outros templos católicos nas povoações do município.
Passando a ser matriz, a igreja mãe das demais igrejas, a Matriz de Nossa
Senhora da Conceição de Poço Redondo tornou-se símbolo maior da crença, da fé e
da religiosidade poço-redondense. A denominação de paróquia (subdivisão da
Diocese de Propriá, abrangendo as diversas comunidades religiosas e igrejas na
circunscrição de Poço Redondo) surgiu apenas em 15 de julho de 1979. Até essa
data, a matriz e as demais igrejas estavam vinculadas a Porto da Folha.
Sua
feição, contudo, já foi muito diferente da que atualmente se apresenta. Nasceu
na simplicidade, surgiu como quatro paredes nuas com portas laterais e à
frente, e um singelo altar. O único luxo que se tinha era a imensidão de fé em
cada coração que ali adentrava. Desde então, seu percurso foi de progresso -
mas também de retrocesso (principalmente quando se viu desprotegida e sem
telhado).
Nos tempos
mais antigos, e quando ainda pertencente à Paróquia de Porto da Folha, apenas
duas missas eram celebradas, uma em data escolhida pela comunidade e a outra na
celebração da padroeira, no mês de agosto, daí ter surgido a famosa e cada vez
mais ofuscada Festa de Agosto. Para a celebração das missas, o sacerdote
geralmente chegava à povoação montado em burro e após uma longe e cansativa
viagem.
Fato
interessante ocorreu em 1929, quando o bando do cangaceiro maior, o famoso
Virgulino Lampião, assistiu missa celebrada pelo Padre Artur Passos. Uma cena
que em muito atiça a imaginação: a cangaceirama em plena devoção, orando
ajoelhada, enquanto o velho sacerdote discorria sobre os pecados do mundo.
Lampião, fervoroso católico, devoto do Padim Ciço e da Senhora Mãe, recebendo a
hóstia sangrada e todo paramentado de embornal, cartucheira, punhal e arma
cuspideira de fogo.
Mas os
fatos, lendas e curiosidades, são muito maiores, e que certamente não cabem na
estreiteza de um escrito qualquer como este. Muitos foram os sacerdotes que já
pregaram perante o seu altar: Padre João, Padre León Gregório, Frei Teodoro, Padre
Fabiano, Padre Mário, Padre Valdinã e muitos outros. A partir de suas posrtas
as Santas Missões, as presenças sagradas de Frei Damião e Dom José Brandão.
A partir
de suas portas e ecoando pelo mundo-sertão, as vozes beatas, as vozes da fé, os
cantos e as ladainhas. Vozes ainda presentes como a de Marizete e Geovanete, e
ecos já saudosos como os de Mazé de Iracema e Maria José de Zé Preto. Um mundo
sertanejo e sua igreja, aquele mundo de Mãeta, de Bebela, de Dona Lídia, um
mundo de tanta crença e tanta fé que se perpetua no próprio tempo.
Mas eis,
ali no centro do mundo chamado Poço Redondo, a bela matriz de braços abertos.
Lá dentro, mas com mãos estendidas por todos os sertões, uma Senhora Mãe
Sertaneja a dizer: Abençoados sejam os filhos meus!
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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