*Rangel Alves da Costa
A lágrima é a expressão maior do choro, do
pranto, da lamentação, segundo dizem. O escorrer de uma lágrima verdadeira
resume todo o sentimento da alma, segundo a lição do poeta.
Uma lágrima derramada, e vinda da nascente
dos sentimentos, simboliza a dor, o sofrimento, a aflição, conforme muitos
afirmam. Assim, a face molhada é o rio que escorre trazendo consigo as
inundações interiores.
Muitos assim afirmam, muitos dizem assim. Mas
também confirmo tudo como verdade, eis que conheço bem a lágrima, o pranto, o
choro, a lamentação. Também conheço de onde tudo isso advém: o luto, a
melancolia, a tristeza, o sofrimento.
Contudo, uma coisa há de ser revelada: às
vezes, mesmo chorando, minha lágrima mantém-se oculta, escondida, não revelada.
Outras vezes, mesmo sem sequer esboçar feição de choro, eis que a lágrima brota
e jorra incontidamente.
Mas situações existem que não permitem disfarces.
Instantes existem onde o choro é apenas choro e a lágrima é apenas lágrima. As
nascentes estão no íntimo, no âmago, enquanto as correntezas afluem do olhar.
E ao afluírem do olhar, então, dos beirais dos
olhos e da face em diante, tudo é veio d’água, é fonte, é tanque, é represa
irrompida, é rio, é mar, é oceano. E o pior é que, em instantes assim, nunca
sei navegar, nunca sei vencer a força das águas muitas.
Não há o que esconder quando a lágrima clama
para brotar, jorrar, escorrer. Tão verdadeiro deve ser o ser humano quanto a
expressão de seus sentimentos, e sem rodeios ou ocultações. E não adianta
fugir. A dor não mente, o sofrimento não se esconde por muito tempo, a agonia
não se transmuda em contentamento num repentino desejo.
Contudo, por vezes até que posso disfarçar
uma lágrima. Mas tal lágrima disfarçada nunca é igual àquela nascida de uma
perda irreparável, de um adeus voraz, de uma partida irretornável. A lágrima
nascida de um adeus, por exemplo, jamais pode ser aprisionada na alma.
Outras lágrimas, porém, suportam ficar
estancadas ou mesmo ocultadas. A lágrima da saudade é uma destas. Mesmo a
saudade grande surgida em ponta de punhal ainda assim há a possibilidade de ser
contida pela esperança de reencontro ou de breve abraço.
A lágrima da solidão, da tristeza
inexplicável, da simples vontade de chorar ou de outros acasos da vida,
igualmente pode esperar um motivo mais justo para se derramar. Instantes surgem
que até dificultam a contenção de um rio que quer correr. Mas basta sopesar o
verdadeiro motivo para se saber que a lágrima é preciosa demais para escorrer
ao léu.
Mas quando eu choro lágrima eu choro de
verdade. Não me envergonho, não me escondo para chorar, não vou atrás de
escondidos para expressar o sentimento brotado. E melhor sem lenço, e melhor
não forçar os olhos, e melhor nada fazer. Só há uma condição quando a lágrima
vem: que ela se vá, com suas causas e suas forças.
E assim porque chorar é melhor, é mais justo
e até mais humano. Chorar assim, deixando que o mar avance e o oceano se
inunde, é a plena demonstração de que os sentimentos existem e foram
despertados por um justo motivo.
Agora mesmo não estou chorando. Motivos para tristezas
e aflições são muitos. Razões para marejar os olhos são incontáveis. Mas outros
motivos não. A dor do amor, por exemplo, não merece lágrima senão o
esquecimento. Mas a dor da perda de alguém querido sim.
Não só merece a lágrima, as lágrimas, os rios
de lágrimas, como as sempre molhadas relembranças.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário