*Rangel Alves da Costa
Sou uma casa velha. Casa velha, de portas e
janelas fechadas, abandonada. Paredes frágeis e frestas de sol e lua. Sou uma
casa velha sim. Ninguém mais bate à minha porta, ninguém mais chega à minha
janela, ninguém anuncia chegada. Outrora as flores no jardim, as folhagens formando
tapete entre o ocre e o dourado, pombos catando grãos, um banco para repouso e
memória. As borboletas bailavam, os colibris dançavam, as abelhas beijavam as
pétalas adocicadas. Pelas janelas abertas entravam as manhãs e as noites. Pela
porta aberta entrava a notícia boa, o sopro do vento, o livro de poesias. E
bastou que o outono chegasse. Não a antítese primaveril, mas o outono na força
e no viço, na posse e no luxo, nas benesses mundanas. Assim que me vi assim,
sem mais ter a ilusão, então a realidade mudou de cor, de viço, de força, e
assim chegando as folhas secas e a ventania. Quando tudo sumiu, então a casa
fechou sua porta, trancou sua janela, e deixou que o tempo cuidasse de todo
amanhã. Hoje apenas uma casa velha. Uma existência quase sem existir, uma vida
quase sem viver, uma escuridão sem luz que sirva de guia. E os que adiante
passam e não sentem mais o perfume nem a palavra alegre, não se encantam com o
glamour do passado, simplesmente seguem dizendo a si mesmos: não existe mais,
não existe mais!
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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