*Rangel Alves da Costa
A culpa dessa meninada que desde cedo
acostuma com os maus costumes é dos pais que não se comportam mais como pais,
que não cuidam dos filhos como deveriam zelar, que gestam os filhos e depois
entregam ao mundo. E a culpa maior ainda quando depois lavam as mãos perante os
erros e os desatinos, como a dizer que fiz a minha parte e agora que se vire.
Ao olhar pra trás, certamente avistarão pais omissos, descuidados, insensíveis,
maus exemplos para os filhos. Nem sempre, mas muito ocorre assim.
Que pais são estes que não mais educam seus
filhos, que desde cedo não ensinam o que é certo e o que é errado, que não
estão nem aí para que façam ou que deixem de fazer? Filho é muito diferente de
só fazer, como diz o outro. Filho é responsabilidade, é cuidado, é colocar na
rédea para que a espanação do mal não chegue primeiro. Pai que não cuida de sua
criança ou do filho adolescente, mais tarde não pode tá reclamando do erro por
ele cometido. Certo que filho não é bicho pra ser domado na rédea, mas também
não é cria que deva ser relegada ao mundo.
Então que se repita: A culpa dessa meninada
que desde cedo acostuma com os maus costumes é dos pais que parece só saber
fazer e depois deixar tudo num tanto faz. Não pode ser assim de jeito nenhum.
Como o seio deve ser levado à boca do filho para amamentação, como a mamadeira
deve ser feita para ser cuidadosamente servida, como o mingau deve ser levado à
boca do filho, como os pais devem ensinar ao pequenino como sozinho se
alimentar, bem assim deve acontecer em muitas situações da infância. A criança
vai aprendendo pelos pais, toma conhecimento das coisas pela imitação, e tal
cuidado deve ser prorrogado indefinidamente. Ora, os verdadeiros pais nunca
emancipam seus filhos. Cada filho, ainda que adulto ou já envelhecido, sempre
será o menino ou menina da mãe e do pai.
Mas não, o que se vê é uma meninada já
nascida sem chance de ser criança. Esta, desde o nascimento, passa a viver em
dois mundos: o seu e aquele que a rodeia. Interiormente, apenas a ilusão
existencial, vez que sem noção de certo ou errado, sem conhecimento do que está
certo ou não fazer, tão somente obedecendo aos impulsos. Pode chorar quando
quiser, pode sujar a fralda quando quiser, pode estender a mão e derrubar tudo
adiante, pode fazer o que quiser. Sua idade permite, pois ainda em formação. E
por estar em formação é que deve ser observada, cuidada e aprimorada em suas
atitudes, desde muito cedo. Cabe aos pais e familiares principiar outros
ensinamentos.
Pais existem que logo dizem “faça assim
não!”. Ainda que a criança sequer entenda o que seja o “faça assim não!”, tal
atitude já demonstra, por si mesma, compromisso e responsabilidade para com o
seu: não quer que erre. Contudo, pais também existem que imaginam que a criança
já conhece o certo e o errado desde cedo e, por isso mesmo, entrega sua cria à
própria sorte. O filho pode errar e repetir o erro que ninguém diz nada. A
criança pode acostumar em encher a boca do barro da parede e os pais acham tudo
normal. O pequenino pode ir rastejando e sair pela porta que os pais não estão
nem aí. E o pior: muitos dizem que aprendem a viver assim. Ledo engano. A
criança deve aprender a viver pelo acerto, fazendo coisas que não a desvirtue
desde suas primeiras fases de vida.
Noutros tempos – e de idade não muito
distante -, eram os costumes, além dos pais, que guiavam a criança ao mundo. Em
muitos contextos, sem os chamados nefastos das inovações tecnológicas, tudo ao
redor era um parque de diversão e toda presença familiar um livro de lição.
Ora, não havia o dizer de que a meninada não podia sequer se molhar por causa
das viroses, das gripes, das doenças que se alastram pela fragilidade orgânica.
Criança tomava banho de chuva, espanava feliz embaixo de biqueiras, corria na
rua lamacenta, jogava seu corpo nas calçadas molhadas e até nas águas juntadas
pela chuvarada. Ia caçar passarinho, brincar de cavalo de pau, pentear cabelo
de boneca de pano, varrer calçada de casinha de boneca, jogar bola de gude e
correr atrás de bola de meia. E com pés descalços.
Quando os pais se arvoravam do dever e
direito de ser verdadeiros pais, perante os mínimos erros chamavam os seus ao
aconselhamento, ensinavam acerca dos perigos do mundo depois da porta de casa,
preocupavam-se com as condutas e com as amizades, muitos não dormiam até que o
filho retornasse. Mas hoje, como dito, tudo parece revirado. Muitas vezes o
filho opta brinquedo tecnológico ou pelos modismos, unicamente pelo fato de que
os pais não lhe apresenta qualquer opção mais saudável. Tanto assim que
atualmente a criança não sabe mais brincar. Conhece apenas o site, o atalho, o
link, o jogo virtual.
E não há que se dizer que nada pode ser feito
para mudar. Tudo pode mudar sim, mas a partir da conduta dos pais. Ou estes se
responsabilizam pelo que querem ter como filho ou amargão as angústias de um
mundo que não perdoa.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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