*Rangel Alves da Costa
Não sei o
que dizer. Juro que não encontro palavras que verdadeiramente expressem a minha
intenção. É fácil escrever para uma menina urbana, citadina, acostumada com as
leituras e os proseados. Mas não para uma menina da roça, tímida, acanhada,
ainda que de boa leitura e boa escrita.
Na
verdade, o que me faltam são os ajustamentos das palavras. Não quero ser
poético demais nem frio em demasia. Não quero florear minha escrita nem lançar
perante o seu olhar uma carta qualquer. Será flor do campo com feição de flor
do campo, gosto de fruta por que com sabor de fruta madura. Uma escrita assim
solenemente terna e apaixonante, ecoando um canto de passarinho e um murmurejar
de folhagem ao entardecer.
Mas como
eu queria que cada palavra tivesse cheiro de mato, que cada letra cheirasse a
terra molhada, que todo o escrito tivesse cheiro e sabor de doce de panela,
tivesse a feição e o gosto do araçá madurinho, tivesse a beleza de uma flor de
mandacaru. Quem dera, minha amada, quem dera que o seu olhar, ao passear pelas
linhas trêmulas e desajeitadas, encontrasse relvas, brotos, sementes e folhas.
Quem dera minha menina, que a cartinha tivesse voz e dissesse: você é linda!
Mas não
sei, não sei se vou conseguir. Sou da cidade demais, cheiro a cidade demais,
tenho em mim metade de asfalto e metade de cimento. Ainda que eu sinta e viva o
sertão, que tanto ame sua malhada e sua catingueira, sua janela e o bicho
mugindo adiante, também sei que sou ruído e buzina demais. Compreenda-me. Não
sou assim tão de ferro e ferrugem. Não sou assim tanta poeira e maresia. Dentro
de mim eu guardo e levo o encanto das coisas belas, a magia das coisas que
tanto bem fazem ao coração. Sou assim como você, minha menina. Não vivo a terra
e o barro, nem sempre ouço o galo cantar nem o bicho berrar, mas também sou
assim como você.
Um pedaço
de papel qualquer. Não quero folha bonita nem caneta dourada. Não pingo um
tiquinho de perfume sobre a folha porque não uso loção. Mas juro, e juro por
tudo na vida, que não há coração mais apaixonadamente apreensivo do que o meu.
Ora, escrever com palavra, escolher cada palavra como se fosse voz, escolher a
voz ideal para ser ouvido. E, quem sabe, ao segurar nas mãos e lançar o olhar
sobre os meus dizeres, você enfim sorria o mais belo sorriso do mundo e
reconheça, no mais profundo do coração, que há alguém que verdadeiramente a
ama. Então leia, por favor:
Boa tarde,
boa noite, bom dia, meu amor... Sabe o que eu tô sentindo agora? Aquilo mesmo
que os horizontes sentem quando o sol vai embora. Aquilo mesmo que o alvorecer
sente quando a lua vai embora. Aquilo que mesmo que o lenço sente quando já não
há vulto na curva da estrada. Saudade, saudade, saudade...
Ontem
falei com você, meu doce araçá, minha fruta do mato, minha flor silvestre, mas
foi como se sua palavra somente aumentasse minha vontade de voar, de ser
passarinho, de chegar à sua janela e pousar no seu lábio. Lábio de mel sim, um
favo na flor, um beijar beija-flor. E eu aqui, tão distante e tão sozinho,
imaginando você tão bela com sua singeleza e simplicidade. No umbral da janela,
mirando as distâncias ressequidas de sol, mas com olhar tão de mar que tudo
parece encharcado de benção.
Meu amor,
meu amor. Menina da roça minha flor. Chinelo no pé ou descalço pé, pulseira de
cipó trançado, cabelos ao vento, a roupa mais simples que possa existir, mas
sempre tão bela. A roupa, minha menina, é o corpo que faz, é o gosto que faz, e
não a moda que manda. Seja sempre assim. Continue tímida, continue acanhada,
continue com olhos fugidos, continue quase sem sorriso. Vá caminhar ao redor,
conversar com a natureza, sentar numa pedra, riscar pelo chão. Desenhe um coração
num tronco de pau e depois escreva nossos nomes entrecruzados.
Nada mais
belo que esse encanto do simples, da ternura da vida. Compreendo que seja assim
e peço que assim continue. Nada force ou leve pra dentro de si nada que não
seja do seu jeito ou do seu agrado. O mundo lá fora é um mundo, mas jamais
igual ao mundo que há em você e que a rodeia. Quero ouvir sua voz quase num
sussurro, quero afagar o seu corpo de pétala e seu lábio de flor, quero dizer
bem baixinho: amor, meu amor! Daqui, daqui dessa dolorosa distância, abro minha
mão para um amado beijo e depois lanço em voo pelos horizontes do entardecer.
Beijo que
chega já. Sinta o beijo em você. Sou eu!
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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