Rangel Alves da Costa*
Os olhos nada puderam ver porque nada mais restava daquele pequeno jardim. E não porque estivesse completamente destruído, esturricado, ressequido e com o resto das plantinhas mortas ao redor. Nada disso.
Como era ali debaixo do carro de boi antigamente, agora voltava a ter a mesma aparência. Apenas terra e mato rasteiro, apenas o chão com as marcas já existentes. Apenas isso. Quem olhasse agora nem poderia imaginar que em algum instante tudo estivesse diferente no local.
Como as plantinhas chegaram, juntamente com o montinho de terra, sumiram dali, tomaram outro rumo, se transformaram noutra coisa e noutro lugar, talvez. Crisosta verdadeiramente não sabia o que fazer diante dessa situação.
Olhou de lado a outro tentando encontrar uma resposta, avistar algum sinal, mas nada que enxergava dizia nada. Quis imediatamente entrar na mata e seguir até o local do sepultamento do menino. Talvez encontrasse alguma resposta por lá. Se as plantinhas haviam saído daquele lugar e vindo parar aqui, então não seria difícil que houvessem feito o retorno.
Aquele era mais um preço pago pela sua constante tristeza, pelo seu comportamento alheio às felicidades do mundo. A voz em sonho avisou que seu entristecimento causaria a perda daquilo que tomava tanta beleza e esplendor diante do seu olhar.
Primeiro a morte das plantas ao pé da parede, restando apenas uma como algum sinal que até agora não compreendia qual era; depois aquela terrível situação, aquele sumiço inexplicável das outras plantas. E não havia restado uma sequer debaixo do velho carro.
Entraria na mata sim, mas no dia seguinte. Já estava entardecer e logo mais o tempo começaria a escurecer e seria perigoso demais estar afastada de casa e em meio a plantas e bichos. E se martiriza entre a vontade de evitar a tristeza e a aflição que lhe chegava quase fazendo chorar.
E disse a si mesma:
Meu Deus, como buscar alegria se me chega a sede diante de um vale de lágrimas, como encontrar a felicidade se diante do meu olhar se mostra uma realidade de angústia e aflição? Quero a flor e só alcanço o espinho, quero sorrir e só me vem a dor, quero caminhar entre flores e por todo lado me vem um labirinto amedrontador. Aquela voz me chega em sonho e diz que o meu entristecimento seria motivo para o desaparecimento dessas plantinhas que tanto gosto. Mas é como se quisesse me forçar ao sorriso e à alegria. Não precisava ser nada desse jeito. Tudo deve ser espontâneo, nascer vivo dentro da gente. Do coração feliz é que nasce o motivo para toda felicidade. O rosto só não se mostra fechado quando não há motivo para ser diferente, a boca só se volta ao sorriso quando encontra do que sorrir, a paz espiritual só chega quando as coisas boas acontecem na vida da gente. Sim, não finjo nada. Como eu queria a felicidade meu Deus, como eu gostaria de sair por aí pulando e cantando, como eu daria tudo na vida para toda manhã abrir a porta e de braços abertos correr pelos descampados, me misturando à alegria da natureza. Mas não. O que tenho é o que sou; o que sou é o que me rodeia; e o que me rodeia são esses dias de sempre, esse tempo que não muda, essas horas que passam e nada se transforma no meu coração. Sei que é muito difícil encontrar a felicidade, principalmente quando tudo tem de ser construído sozinha. E sozinha como vivo e sou. Mas a partir de agora tanto faz que me venha o sorriso e a lágrima. Serei apenas eu, e como sou. Não posso mais continuar imaginando ter ouvido voz dizendo que faça isso ou aquilo, sob pena de esquecer de mim mesma e ainda por cima correr o risco de não ter vida própria por medo de não atender ou não estar satisfazendo ao desconhecido.
Depois arrumou forças para empurrar o carro de boi até mais distante, já perto do cercado de madeira ainda caída, e dizendo a si mesma enquanto batia a mão uma na outra para afastar a sujeira: Se alguma coisa quiser nascer ou aparecer por ali que seja debaixo do tempo, na claridade do dia ou debaixo da luz da lua.
Pegou a enxada perto da parede, bem ao lado da plantinha que restou, e entrou em casa. Colocou a ferramenta num canto, lavou as mãos, depois se dirigiu até cadeira de balanço. Colocou-a ainda mais próxima da janela e sentou.
Estava com uma feição boa, com aspecto até sorridente. Havia tirado um peso de sua mente e se sentia outra pessoa. Agora tanto fazia tudo. E achava bem melhor que fosse assim.
Continua...
Poeta e cronista
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