OLHOS QUE VEEM, CORAÇÕES QUE SENTEM
Rangel Alves da Costa*
Coisas existem que não exigem um estudo aprofundado para saber e sentir. No meu caso, nunca fui seminarista, jamais estudei Filosofia da Religião ou fiz curso bíblico. Do mesmo modo, não sou católico fervoroso nem freqüento igrejas com assiduidade.
A bem dizer, todas as vezes que vou até um templo católico o faço naqueles instantes sem missa, sermões ou encontros religiosos. Prefiro a igreja quase sem pessoas, silenciosa, naqueles instantes de paz somente entrecortados pelos sons dos anjos voando ao redor, das chamas das velas orando, das vozes que nos chegam porque desejamos ouvi-las.
E porque não sou estudioso da religião nem católico fanático, é que posso compreender sem paixões a presença de Deus, os mistérios dessa convivência, sua importância na vida e a absoluta necessidade de ele existir profundamente na vida de cada um.
E afirmo ainda que mesmo o mais cético, o maior ateu, o maior descrente de sua existência, ainda assim, através dos pequenos atos cotidianos, confirma sua imensa presença. E não somente isso, pois acaba devotando um amor imenso na palavra que diz não acreditar, mas cujo espírito é forçado a aceitar diante daquilo que os olhos veem e o coração sente.
Mesmo que deitem sem fazer orações, sem agradecer a Deus pelas conquistas do dia e pedir proteção para o dia seguinte, ainda assim ao acordar e abrir a janela seus olhos se encherão de alegria e felicidade pela maravilhosa manhã que encontram. Não dizem nada nem querem pensar, mas sabem de onde vem a aquela força poderosa que enche de cores as paisagens.
Ainda que não tenham uma Bíblia na cabeceira da cama ou em qualquer outro local da casa, jamais tenham lido um Salmo ou um Evangelho, não conseguem se afastar da presença de Deus. Eles mesmos, os outros, os seres da natureza, e tudo em que se assenta o seu mundo, não vieram ao acaso nem fazem parte da vida porque surgiram do nada, mas através de uma obra de criação divina, de um desígnio de Deus.
Mesmo que nunca entrem numa igreja, ignorem toda a religiosidade e todo o poder divino, e além disso se proclamem totalmente descrentes na existência de uma força superior que dispõe sobre tudo, num ateísmo exacerbado, ainda assim não estarão afastados de Deus. E isto porque basta essa negação para que logo se tenha a certeza de sua existência. E pelo simples fato de que ninguém pode negar a existência daquilo que não dá sinais que possa existir.
Mesmo que abominem cruzes, terços e rosários, que também neguem a existência de santos e anjos, que não creiam em milagres e na ação divina, que pensem que a vida se faz por si mesma e cada um é o seu deus e dono do seu mundo e seu destino, ainda assim estarão, a cada momento, na presença de Deus. E não porque Deus seja onipresente, onisciente e onipotente, mas simplesmente porque a invisível mão que afasta o perigo e mostra o caminho não tem o orgulho nem a vaidade de dizer de onde vem.
Ainda que abram a boca para blasfemar, que encontrem ouvidos para pregar seu ateísmo, que profanem os símbolos religiosos, que procurem noutra crença a ilusão fortalecedora de suas fraquezas, ainda assim não conseguirão se afastar da presença de Deus. Infelizmente mais tarde, quando a verdade recair sobre si, quando as dores do mundo afligirem a alma, será no pedido de perdão que encontrarão a bondade divina para o acolhimento que nunca esteve ausente.
Lembra da janela citada no início e que se abre para a maravilhosa manhã? Pois bem, não era manhã nem havia aquela janela para ser aberta. Para certas pessoas tanto faz ter uma janela aberta ou não, pois os olhos de sua alma não conseguem enxergar nada de bom ou significante. Mas para outros, basta a consciência das belezas do mundo lá fora para que a janela se faça presente e os olhos vejam e o coração sinta com devoção.
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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