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segunda-feira, 19 de março de 2012

ESTÓRIAS DOS QUATRO VENTOS: OS PRESENTES

ESTÓRIAS DOS QUATRO VENTOS: OS PRESENTES

                                          Rangel Alves da Costa*



Conto o que me contaram...
Dizem que havia um milionário que todo ano fazia uma imensa festa para comemorar seu aniversário. Toda a elite da cidade era convidada e lá chegava com seus carrões luxuosos, derramando brilhos e antipatias.
Contudo, verdade é que o homem oferecia essa festa requintada quase como uma obrigação. Ora, a família exigia que mostrasse sua riqueza e poder naquela ocasião, onde não era servido nada que não fosse importado.
Como presente recebia objetos de incalculável valor, mas que aos seus olhos não tinha importância nem significado algum. Apenas suportava toda aquela situação, todo aquele poder econômico que não lhe trazia satisfação alguma.
Seu maior sonho era ter uma vida simples, pacata, humilde, reconhecido pelo ser humano que era e não pelos bens que possuía. Daria tudo para sair da cidade, deixar de usar gravata, ter diariamente uma agenda à sua frente, ter de suportar as burocracias e os insuportáveis métodos de produção. Já estava velho pra tudo isso, enjoado demais dessa situação, das festas insuportáveis e tudo o mais.
Decidiu então que não faria mais comemoração de aniversário. Faria sim, mas distante dali, em outro lugar, numa cidadezinha pacata para onde se mudaria. Os herdeiros, se por um lado gostaram da chance de tomar frente dos negócios, por outro lado não aceitavam que o patriarca passasse a viver agora apenas como um interiorano comum.
Mas o velho senhor procurou justificar bem sua decisão e disse:
“Gravatas importadas, relógios de ouro, carros importados, canetas de nome esquisito, são presentes que agora cabe a vocês receber, logicamente que se fizerem por merecer. Mas eu, de agora em diante, lá na cidadezinha onde vou morar, em toda grandiosa festa de aniversário que fizer só aceitarei receber aqueles presentes próprios daquele povo.
Sendo um povo pobre, trabalhador, mal tendo para o sustento próprio, certamente que não teria cabimento em dar um presente além de suas posses. Mas fiquem vocês sabendo que tudo o que eles possam oferecer sempre terá maior valor dos que esses falsos brilhantes que tenho recebido até agora.
E então serei o homem mais feliz do mundo ao receber como presente de aniversário uma melancia, uma abóbora, um pouco de quiabo ou maxixe, uma cuia de araçá.
Serei de indescritível felicidade ao receber um queijo de coalho, uma tigela de coalhada, um litro de leite fresquinho, um bolo de macaxeira ou de leite.
Que prazer imenso será receber um barquinho talhado na madeira, uma rústica escultura de santo, um oratório talhado na madeira sertaneja.
Que graça divina ser presenteado com uma galinha de capoeira, um cesto de ovos, um quilo de carne de bode, um chapéu de couro, uma sandália feita de couro cru, um berrante lustroso.
E os que nem isso poderem ofertar, e coisa que nunca será exigido, certamente virão com seu canto sanfoneiro, sua prosa recheada de filosofia matuta, seu aboio de saudade da vaqueirama, seu toque no pandeiro ou no zabumba.
E então serei verdadeiramente o homem mais feliz do mundo, pois reconhecido naquilo que meu íntimo espelha e o meu caráter reflete”.  




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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