*Rangel Alves da
Costa
A palavra
escrita não tem o poder da voz. A linguagem textual não substitui a presença. As
frases e os contextos jamais alcançariam, por exemplo, o poder expressivo de um
olhar, de uma aproximação, de uma saudação, de um abraço afetuoso. Mas ainda
assim me aproximo o máximo que puder para dizer: Feliz Natal!
Feliz
Natal pra você! Tanto gostaria agora que este escrito estivesse perfumado em
jasmim, alfazema do campo, uma suave fragrância silvestre; como gostaria que as
palavras chegassem acompanhadas de um buquê de flores matinais, de um cestinho
de frutas colhidas em pomar, de miçangas de cipó de caroá e com uma concha de
mar como pingente.
Ai como eu
gostaria de juntar às palavras uns presentinhos que tanto lembram você. Tenho
certeza que iria gostar de receber um poema escrito em folha seca, um pedaço
rústico de madeira com seu nome talhado, um patuá batizado na correnteza do
rio, um segredo guardado de uma garrafa no mar recolhida. A simplicidade não
requer o fausto nem o suntuoso, o dourado nem a pedraria, mas a cordial
singeleza.
Tantas e
tão boas as intenções. Não somente porque o espírito natalino ainda está em mim
preservado, nada fruto de um repentino desejo de agraciar, mas sim uma vontade
imensa de compartilhar contigo algumas pequenas e essenciais coisas da vida. O
que alenta meus dias de sol e lua haverá de ser repartido com quem merece ser
recordado.
Um dia, do
alto da mais alta montanha, um velho sábio fez ecoar pelo vento: O coração que
compartilha torna o espírito multiplicado; o que é partilhado pelo desejo,
recompensado será pelo prazer; o que é dividido com quem mereça, faz com que a
semente brote e cresça e o seu grão nunca pereça.
Na
presença, aí perto de você, tudo seria mais fácil. Sei que gostaria de ouvir
Fernando Pessoa, Florbela Espanca, Mário Quintana, Drummond, Cecília Meireles.
Sem livro aberto, mas com as páginas da mente devidamente marcadas, declamaria
poema e poesia até que a lua surgisse lá em cima e a aragem da noite chegasse para
recolher os restos dos versos ainda ecoando.
Talvez até
eu recordasse alguma velha canção de fogueira debaixo da noite. Mas cantarolo
agora, baixinho, um tanto entristecido, confesso: “Como vai você? Eu preciso
saber da sua vida, peça a alguém pra me contar sobre o seu dia. Anoiteceu e eu
preciso só saber. Como vai você?...”
Sim, como
vai você? Sei que esta época natalina nos joga diante do espelho das nostalgias
infindas. Sei que as recordações chegam mais vivazes, mais angustiantes, quase
fazendo sofrer. E faz. Difícil recordar, abrir os baús, reencontrar e não
padecer. Ora, não podemos fugir dos sentimentos. Por mais dolorosos que sejam,
são os sentimentos que nos tornam melhores e mais humanizados, sensíveis e
amorosos.
Nada é
fácil. E neste período natalino tudo parece emoldurado em tristezas,
relembranças e nostalgias. Os corações batem mais fortemente, os olhos
lacrimejam por vontade própria, os olhares se voltam aos horizontes em busca de
visões e respostas. A janela entreaberta logo adiante da velha cadeira de
balanço (que parece levemente balançar), traz apenas uma luz sombreada ao invés
da cor alegre do dia. Sempre assim no período natalino.
Muitos
agora estão recolhendo as folhas secas que já se avolumam no chão do ano que se
finda, outros já começam a abrir as portas e janelas para o novo sol. Mas eu
continuo apenas pensando no melhor presente que possa oferecer a você. Talvez
jamais encontre a dádiva ideal, mas se compartilho o que para mim desejo, então
certamente receberá uma folha em branco. Sim, uma folha em branco!
E nesta
folha a possibilidade de escrever o que bem desejar para o instante e o amanhã.
Os sonhos, os planos, as aspirações e inspirações, o melhor que deseja
conquistar. E também o que deseja esquecer, não mais recordar. Depois
arremessá-la ao vento, e melhor ainda na ventania, pois temos pressa de
felicidade, precisamos tanto de felicidade.
E nesta
folha em branco a esperança que nela surja um Salmo que represente sua
esperança de um novo tempo: Que das lágrimas os lenços não sejam o seu socorro,
pois já não chorará qualquer dor de tristeza ou de sofrimento. Que ao invés da
lágrima, dos teus olhos surja o brilho ensolarado do renascimento e de um novo
canto. Que do renascimento e do novo canto, sua alma e seu espírito enfim levantem
e, de mãos levantadas ao alto, digam em direção aos montes do céu: Obrigado
Senhor!
E nesta
folha em branco, que a mim e a todos caberá escrever, que cada palavra e linha
sejam de reconstrução, de reencontro ao amor e a paz. Na parte da folha que me
resta, além de outros desejos do coração, certamente escrito estará: Feliz
Natal pra você!
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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