SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

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sábado, 3 de abril de 2010

NO REINO DO REI MENINO – LVI

NO REINO DO REI MENINO – LVI

Rangel Alves da Costa*


Otnejon estava se sentindo com todos os motivos do mundo para acabar de vez com a vida do casal prisioneiro, por achar que estavam lhe enganando até aquele momento, procurando esconder o local exato onde estava escondida a fortuna; para atacar e destruir o Reino de Oninem, porque o menino rei não havia cedido em nada suas exigências para evitar o ataque e para libertar os seus pais; e principalmente para mostrar ao indolente e teimoso menino quem realmente era poderoso e fazia e desfazia por aquelas bandas.
Contudo, o que mais lhe enchia de ferocidade e ódio naquele momento era o fato de sua mãe ter aceitado e morar em outro reino que não o seu. Não estava nem aí pra ela, e por isso mesmo a havia deixado à míngua e vivendo na mais lamentável pobreza, porém se achava no dever de se indignar com aquela atitude, como se sua honra de filho estivesse ferida. Acabar com Oninem era ainda uma forma de dar fim também a ela, que optou ir para o lado do inimigo, segundo ele.
Nesse estado de espírito, permeando estágios de mais ou menos loucura, mas sempre muita insanidade, o baixinho mal-afamado, talvez por já ter perdido a noção sobre a realidade das coisas, nos últimos dias vinha agindo somente por impulsos: mandava matar um, perdoava outro; se fazia destrambelhado a sorrir e a gritar num instante e no outro já estava aos prantos; no intervalo de cinco minutos podia mudar de opinião várias vezes; contudo, qualquer que fosse a situação que estivesse, se trovões e relâmpagos começassem a surgir pelos céus ele procurava o primeiro buraco para entrar.
Os cavaleiros mercenários enviados pela Grande Ordem dos Rebeldes a seu pedido já estavam a caminho. Eram centenas de homens impiedosos que faziam das guerras e das destruições seus motivos maiores na vida, por isso mesmo a cada nova empreitada era como se estivessem caminhando para um encontro comum com a vida ou com a morte. Tais aspectos os tornavam ainda mais perigosos. Uma vez instalados em Edravoc, era só se juntarem aos homens do baixinho e a grande horda do mal estaria pronta para o ataque. Restando somente a ordem de Otnejon.
Num desses instantes de indecisa loucura, o baixinho mal-afamado ordenou que retirassem Lucius e Lize daquela jaula e os deixasse sem amarras tanto nos pés como nas mãos, dentro de um pequeno cubículo sem portas, de onde poderiam sair na hora que quisessem. O baixinho imaginou que fazendo assim daria a chance para tentarem fugir, e se assim fizessem certamente que iriam atrás da fortuna. Então seria o momento certo de colocar as mãos naquilo que achava que lhe pertencia.
Contudo, imaginou ainda que somente deixando os dois livres de amarras por algum tempo seria possível que recuperassem um pouco das forças que pareciam já ter se esvaído desde muito. Precisariam estar mais fortes quando fossem colocados como escudos humanos à frente das tropas que atacariam o reino de seu filho, pensava o baixinho. Assim, tinha a certeza de que vendo seus pais correndo risco de morrerem se contra-atacassem, as tropas de Oninem recuariam e ele conseguiria todos os seus objetivos: invadir e tomar para si o reino inimigo sem erguer uma espada sequer.
Ao entardecer desse dia os cavaleiros da Grande Ordem chegaram às portas do castelo, momento em que Otnejon mandou que os seus homens fossem trazer à força toda comida que encontrassem nas residências dos seus súditos, pobres pessoas que mereciam melhor sorte do que habitar num lugar como aquele. E disse ainda que matassem qualquer um que achasse ruim, que reclamasse, esquartejasse ali mesmo e juntassem os seus membros às carnes que serviriam para alimentar os famintos homens que já estavam à sua disposição para a guerra.
Em Oninem, Gustavo dava ordens aos seis cavaleiros, todos com missões específicas para não deixar uma só falha nas estratégias de guerra traçadas para os combates em campo, frente a frente com o inimigo. O pequeno comandante deu-lhes a liberdade de escolherem as melhores armas e ações, providenciarem as tropas adequadas e definirem o momento certo para cada situação de confronto. Achava melhor assim, dando-lhes mais autoridade e responsabilidade, de modo que ainda meninos já aprendessem como lidar com as guerras que são pensadas pelos ditos adultos.
Ele mesmo, Gustavo, estava mais preocupado e ansioso era com a entrega da falsa coroa, que àquela altura já deveria estar ali. Percebendo a agitação no amigo, o feiticeiro do bem ficava repetindo: "Calma, calma, que logo logo a sua encomenda estará aqui. Se foi o grande Verny que prometeu está prometido, e pronto".
Ali mesmo na sala onde estavam, Bernal ouviu cochicharem em seu ouvido que o sábio duende encontrava-se lá em cima, na torre do castelo, aguardando o menino rei. Que felicidade naqueles dois corações e mentes! Pareciam dois raios ziguezagueando a escada, no afã de chegarem rapidamente onde se achava o ilustre visitante. Mais que isso naquele momento: o ilustre salvador da pátria para Gustavo.
Ao lado do sábio Verny, numa mesinha, estavam duas coroas, a do Reino de Oninem e a falsa. "Veja se consegue distinguir, meu bom menino, a verdade da mentira", disse o mestre das florestas. E antes que Gustavo falasse qualquer coisa ele adiantou:
- A verdade e a mentira muitas vezes se confundem, e outras vezes ainda a mentira pode ter o mesmo ou maior valor que a verdade, desde que seja para os propósitos do bem, pois toda verdade que seja para o mal trará conseqüências piores do que uma simples mentira.
"Pode explicar melhor, grande sábio?", perguntou Gustavo.
- Você mesmo poderá responder: a falsa coroa, a coroa mentirosa, que você tanto precisa, será utilizada para o bem ou para o mal? Vejo nos teus olhos que será para o bem. Assim, ela será tão verdadeira quanto a vitória que terás se souber utilizá-la com sabedoria diante de Otnejon e suas tropas.
- Mas como o senhor sabe disso? – Indagou o menino assustado.
- Lembre que eu sei de tudo – E arrastando o pequeno para um canto falou baixinho – Qualquer uma das duas coroas que você escolher será a falsa coroa daqui por diante e servirá para que alcance os seus objetivos. E mesmo sendo falsa, ela possuirá um poder destruidor muito maior do que a verdadeira. E digo mais: não a utilize tendo dois pensamentos ao mesmo tempo, mas sim escolha o que realmente quer alcançar que ela produzirá os efeitos desejados. E boa sorte bom menino!


continua...



Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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