SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



sábado, 17 de abril de 2010

O ALUNO DE GEOGRAFIA (Crônica)

O ALUNO DE GEOGRAFIA

Rangel Alves da Costa*


Zequinha até que era esforçado na escola, tirava notas boas, era participativo e gostava de discutir em sala de aula os temas propostos pelos professores. O problema era que às vezes queria criar conceitos próprios, levar os conteúdos para uma visão pessoal que não queria abrir mão e assim, de repente, a história passava a ter sido como ele queria; o correto em português era aquilo que ele achava que estava certo ou não; dividia e somava como viesse à cabeça, e pronto. Ninguém conseguia fazê-lo entender que estava errado.
Contudo, problema maior ocorreu em relação ao estudo da Geografia. A professora da disciplina, Norminha era, por assim dizer, mulher de rosto e corpo cheios de virtudes. Esta chegava para ensinar toda cheia de roupas, sem decotes ou mostrando as pernas acima dos joelhos. O mínimo de maquiagem no rosto, apenas um pouquinho de blanche e um batonzinho que nem muito vermelho era. Mas que boca bonita tinha a Carminha...
A bem dizer, as vestimentas que ela usava para ensinar pareciam mais com aquelas roupas de fiéis que vivem pra cima e pra baixo com a bíblia na mão e os olhos na vida alheia, vendo pecado em tudo. Norminha dizia que se vestia assim para não atiçar os pensamentos maldosos daqueles alunos adolescentes. Mas não tinha jeito, pois Zequinha sempre via uma Geografia diferente na professorinha. Um dia ia provar isso, dizia ele consigo mesmo.
A professora passou o mês inteirinho ensinando que a Geografia estuda a superfície terrestre e a distribuição espacial dos fenômenos na paisagem, a relação entre homem e meio ambiente, enfim, a situação do homem na terra, através da análise de elementos tais como o próprio ser humano, plantas, animais, rios, mares, oceanos, lagos, rios, montanhas, vales, altitude, longitude, os climas, os diversos tipos de solos e os aspectos ecológicos, dentre outros fatores. Tudo isso para pedir na avaliação mensal escrita que os alunos escrevessem dez linhas, no mínimo, sobre o que estuda a Geografia.
"A partir do que foi visto em sala de aula, escreva sobre os aspectos mais importantes do estudo da Geografia. No mínimo dez linhas". Foi exatamente isso o que pediu a professora Norminha na prova. A partir daí, tomado pelo seu jeito próprio de querer fazer ciência, sem nenhuma base lógica mas achando que estava correto, é que Zequinha assim escreveu:
"O estudo da Geografia é o estudo da professora Norminha. Se a Geografia estuda a paisagem, o ser humano, o clima, o solo, a vegetação, a hidrografia e um monte de outras coisas relacionadas com o homem na terra, tudo isso pode ser compreendido no corpo da professora Norminha. No corpo da professora tem tudo isso e dá até pra perceber que também podemos estudar outras disciplinas olhando ela. Mas vou dizer por que o corpo da professora é Geografia pura e também pode ser aplicada.
A própria professora e o seu corpo lindo e o seu jeitinho de ser, de andar e fazer tudo são as paisagens da Geografia. Quem olhar bem para ela vai perceber dois oceanos nos seus olhos e um mar na boca molhada e deve ter um rio em outro lugar. Assim que a gente olha pra ela de lado, logo percebe que o terreno possui subidas e descidas e dá pra ver claramente que tem uma parte que é muito mais elevada, e que só pode ser uma montanha.
Olhando de frente pra professora também percebemos muitas curvas e de cara a gente pode comparar os seios dela com dois pequenos montes e o corpo inteiro como um mapa. A pele dela é uma planície morena muita bonita e lisinha, que dá vontade dá gente passar a mão e ir seguindo por toda a sua Geografia. No cabelo podemos perceber o vento batendo nas folhas das plantas. Nos ouvidos e no nariz eu vejo as aberturas que há na terra, mas nos olhos e na boca é que a gente pode sentir que existe um monte de coisas bonitas da Geografia, que são as águas, o clima e até um céu, que é o da boca.
Mas no corpo da professora há muito mais Geografia do que a gente pensa e não pode dizer, pois também tem estradas escondidas, grutas, cavernas, mudanças climáticas e até vulcões, que podem soltar fogo a qualquer instante.
Pra terminar vou dizer o que mais gosto na Geografia da professora Norminha, que é quando ela caminha e parece que vai dar um terremoto na gente".
Quando a professora corrigiu as provas e se deparou com a de Zequinha achou muito estranho aquilo tudo e resolveu dar nota cinco pela criatividade do aluno, e depois ficou realmente pensando na sua Geografia e concluiu que era o próprio fogo dos quatro elementos da natureza e que faltava alguém para apagá-lo e explorar o restante de suas vastidões geográficas.
Dessa vez Zequinha estava com a razão: que belas paisagens, que Geografia a da professorinha!



Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

Nenhum comentário: