SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

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sábado, 3 de abril de 2010

NO REINO DO REI MENINO – LVIII

NO REINO DO REI MENINO – LVIII

Rangel Alves da Costa*


Como planejado, as tropas de Otnejon, incluindo seus homens e os mercenários enviados pela Grande Ordem, passaram a noite se deslocando, transpondo montanhas, rios e florestas, e ainda na madrugada já estavam se aproximando das fronteiras de Oninem. Ali se posicionariam e aguardariam a chegada do baixinho mal-afamado para dar as últimas ordens para o ataque.
Dentro das terras de Oninem, ladeando todas os pontos onde se divisavam os inimigos e mais para dentro das terras do reino, os soldados do menino rei guarneciam vigilantemente qualquer movimento suspeito. Centenas de homens montados em cavalos fortes e velozes, com os melhores armamentos à disposição e sob o comando de experientes comandantes, tornavam essas posições defensivas extremamente preparadas tanto para evitar a invasão quanto para empreender um feroz contra-ataque aos adversários.
Comparando-se as duas forças, observava-se que, se por um lado os combatentes de Oninem possuíam animais e armas mais poderosas e maior organização tática e estratégica para os combates, por outro lado as tropas de Edravoc eram muito mais belicosas, principalmente por se tratarem de homens que nada tinham a perder naquela guerra e que já estavam acostumados a fazer da destruição dos inimigos um meio cruel de sobrevivência.
No primeiro raiar do sol, uma infinidade de homens com suas vestimentas de guerra e com armas prontas para serem usadas, já estava posicionada no traçado de ataque. Não demorou muito e Otnejon despontou por trás de uma montanha acompanhado de outros homens e do casal de prisioneiros. Parou a certa distância das tropas e acenou para um dos comandantes, que logo foi ouvir o que o baixinho tinha a dizer e de lá retornou trazendo Lucius e Lize montados em animais.
Diferentemente do que se imaginava, Otnejon não veio se posicionar à frente das tropas para, ele mesmo, dar as ordens e comandar as ações. Ficou onde estava, um tanto quanto escondido, aguardando os resultados das ordens que tinha dado. Dizem que a todo instante olhava para cima, para as nuvens, para a formação do tempo, implorando por tudo para que não viesse nenhuma tempestade. Não podia enxergar ainda, mas a verdade é que nuvens negras já se formavam no horizonte e uma tenebrosa tempestade já estava a caminho.
No castelo de Oninem, ao ser acordado tão assustadoramente por Bernal, Gustavo apenas perguntou ao amigo se os seus soldados já estavam todos nas fronteiras e se os seis cavaleiros meninos haviam repassado todas as estratégias para os comandantes adultos. Com a resposta positiva, em seguida mandou que o feiticeiro desse um polimento especial na coroa por ele escolhida, de modo que ficasse tão brilhante quanto um raio de sol, e depois a colocasse numa pequena arca de madeira, também devidamente envernizada com o verniz mais intenso.
Quando indagado se iria pessoalmente comandar as ações, disse que iria sim, mas não daria as ordens para o ataque, pois não haveria necessidade disso, mas somente para enviar a coroa para Otnejon, no momento em que este fizesse o seu último blefe. Mandou que cuidasse logo no que havia ordenado, vez que estaria partindo dali a poucos instantes. E que Bernal o acompanhasse.
Assim que olhou para o horizonte e pôde ver a escuridão onde antes eram nuvens, o baixinho começou a tremer e a urinar na calça, fazendo com que o seu cavalo desse uns três pulos como que rejeitando aquela situação. Nesse estado entremeado pelo medo e pela vontade de dar um basta logo naquele estado de espera e ordenar logo a invasão para depois se retirar dali com a coroa em mãos, é que mandou chamar rapidamente o comandante e avisou-lhe que fizesse rapidamente a proposta da troca dos prisioneiros pela coroa, mentindo que iriam se retirar se a permuta fosse aceita. Na verdade, assim que a coroa fosse entregue era para retomar o casal de volta e em seguida invadir o território de Oninem, destruindo o que encontrasse pela frente.
Gustavo já estava adiante dos seus soldados quando, do outro lado da fronteira, o comandante inimigo se aproximou acompanhado por Lucius e Lize, amarrados com as mãos para trás e andando como se os seus pés estivessem cheios de espinhos. Ao ver os seus pais, o menino rei chorou mil lágrimas por dentro, mas decidiu intimamente que não esboçaria qualquer gesto de fragilidade, mantendo-se numa postura de força e determinação.
Lucius, com o remorso lhe corroendo as entranhas, mantinha a cabeça baixa com vergonha de olhar para o próprio filho. Lize, esta parecia uma frágil folha prestes a ser carregada pelo vento, com os olhos embebidos das lágrimas que lhe restavam. Não desejava outra coisa senão poder abraçar e beijar seu menino.
Distante alguns metros um do outro, o comandante começou a gritar: "Como pôde perceber, nosso exército está pronto para invadir o vosso reino. Mas por clemência, o nosso soberano, o grande Otnejon, manda informar que se fizer a entrega da coroa real terá os seus pais de volta e poupará sua própria vida e a destruição de todo o seu reino. O momento de decisão é este: ou a coroa ou a morte de todos. O que tem a responder?"
E o menino rei respondeu no mesmo tom:
- Se o vosso rei quer negociar, que venha ele próprio até aqui. Rei negocia com rei. Então peça que venha à minha frente, que quero olhar nos olhos dele e dar minha resposta.


continua...



Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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