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A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



segunda-feira, 20 de maio de 2019

POÇO REDONDO COITEIRO E CANGACEIRO



*Rangel Alves da Costa


Não há que duvidar: Poço Redondo é coiteiro e cangaceiro. Que isso cause orgulho ou não, que isso seja motivo de regozijo ou de acanhamento, mas o que não se pode negar é que ainda hoje grande parte da população traz na veia, no sangue, no parentesco ou no sobrenome, resquícios daquele cangaço que teve vida vistosa nos seus quadrantes.
Ainda hoje, pelas ruas e esquinas, pelas avenidas e calçadas, nos portais ou nos umbrais de janelas, a presença é constante de filhos e parentes de coiteiros do quilate de Mané Félix, de Adauto Félix, de Messias Caduda e tantos outros sertanejos que no passado serviram como emissários entre cangaceiros e o mundo exterior, além do coito ou dos escondidos das matas.
Sim, o coiteiro agia assim. Como o bando cangaceiro não podia se expor pelas cidades, como os cangaceiros não podiam ir atrás de apetrechos e mantimentos, como a cabroeira não podia levar bilhetes aos coronéis e endinheirados nem devia providenciar carregamentos de armas e munições, então todo esse trabalho era feito pelo coiteiro. Daí o nome: aquele que serve ao coito. E coito sendo o local onde o bando ficava arranchado.
A carne de bode era levada pelo coiteiro, o queijo fresco era levado pelo coiteiro, a máquina de costurar e a linha, bem como o pano e tudo o mais que se precisasse, tudo era missão do coiteiro. Leal amigo do cangaceiro, a ele era confiada a própria vida do bando, pois sabedor de cada passo e de cada local onde a cangaceirama estava. Por isso mesmo que era sempre perseguido e ameaçado pela volante. Muito coiteiro morreu torturado sem nada revelar.
Mas Poço Redondo é essencialmente cangaceiro. Muito mais que coiteiro, é cangaceiro de monta e de multidão. E assim continua, pois por todo lugar é possível encontrar uma raiz daqueles destemidos sertanejos de antigamente. Filhos de Adília, como Nicinha e Paulo. Filhos de Cajazeira (Zé de Julião), como Elício e Inácio. Sobrinhos dos irmãos cangaceiros Sila, Novo Tempo, Mergulhão e Marinheiro, como Mazé de Abdias, Gilaene, Veinho, Silvestre e todos aqueles da família Braz São Mateus, bem como a maioria dos moradores do Alto de João Paulo.
Também por todo lugar é possível encontrar e prosear com parentes do cangaceiro Delicado (irmão de Adília), que são todos aqueles da família Mulatinho, do Alto de João Paulo e da cidade. Muitos são os parentes, principalmente sobrinhos do cangaceiro Zabelê, a exemplo de Tânia Maria, Vera de Emeliana, Vandinha, Bastião de Timbé e Dedé de Rosinha, dentre muitos outros. A família Soares de Poço Redondo, principalmente aquele tronco originário da região do Maranduba, possui parentesco forte com as cangaceiras Adelaide, Rosinha e Áurea. Seu João Capoeira, já na altura de seus mais de cem anos, é irmão da cangaceira Enedina.
Apenas alguns exemplos foram citados, vez que muito mais sangue cangaceiro ainda corre nas veias dos filhos de Poço Redondo. E não há como fugir desse parentesco nem negar as raízes fincadas na história. Ademais, não somente parentes de coiteiros e cangaceiros como de todos aqueles personagens que deram forma e vida ao cangaço na região. Mesmo não fazendo parte do bando ou servindo como emissário de coito, a verdade é que naquele período quase todos os filhos de Poço Redondo se envolveram na dura trama de vida e morte.
Teotônio Alves China, o China do Poço, por exemplo, teve participação destacada na história do cangaço, pois foi na sua residência que houve o célebre encontro entre Lampião e o padre Arthur Passos, entre a cruz e o mosquetão. Tonho Bioto, os da família Joaquim, Zé Cirilo, Zé Vicente, os Lameu, e muito mais, todos tiveram alguma participação perante o cangaço nestes rincões. Assim, não seria demasiado dizer que, mesmo hoje, todo aquele natural de Poço Redondo traz consigo alguma reminiscência, algum vestígio de parentagem, do coiteiro, do cangaceiro e demais personagens que fizeram parte do enredo e trama. Coiteiros que serviram ao cangaço foram mais de dez. Cangaceiros foram trinta e quatro. E toda a povoação servindo, de modo ou outro, ao cangaço. Mas eis a lista dos filhos de Poço Redondo que seguiram os passos do Capitão.
Os homens, num total de vinte e cinco, segundo seus apelidos e nomes: Sabiá (João Preto), Canário (Rocha), Diferente (Nascimento), Zabelê (Manoel Marques da Silva), Delicado (João Mulatinho), Demudado (Zé Neco), Coidado (Augusto), Cajazeira (José Francisco do Nascimento – Zé de Julião), Novo Tempo (Du), Mergulhão (Gumercindo), Marinheiro (Antonio), Elétrico, Penedinho (Teodomiro), Bom de Vera (Luis Caibreiro), Beija Flor (Alfredo Quirino), Moeda (João), Alecrim (Zé Rosa), Sabonete (Manoel), Borboleta (João Rosa), Quina-Quina (Jonas), Ponto Fino (José da Guia), Zumbi (Angelino), Cravo Roxo (Serapião), Cajarana (Francisco Inácio dos Santos – Chico Inácio) e Azulão (Luis Maurício da Silva).
Por sua vez, as mulheres, num total de sete, foram: Sila (mulher de Zé Sereno e irmã de Novo Tempo, Mergulhão e Marinheiro), Adília (mulher de Canário e irmã de Delicado), Enedina (mulher de Cajazeira, o Zé de Julião), Dinda (mulher de Delicado), Rosinha (mulher de Mariano), Áurea (mulher de Mané Moreno) e Adelaide (mulher de Criança, irmã de Rosinha e prima de Áurea).


Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

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