*Rangel Alves da Costa
Não faz muito tempo que fiz uma postagem
afirmando que não demoraria muito para que uma canoa (inteira e de verdade)
passasse a fazer parte do acervo do Memorial Alcino Alves Costa, em Poço
Redondo, sertão sergipano.
Afirmei ainda que ela seria colocada numa das
dependências e que em nada tomaria os espaços dos outros objetos do acervo,
pois uma atitude devidamente planejada para tal. Nada feito sem o planejamento
adequado para tudo desse certo.
As críticas logo surgiram. As afirmações eram
no sentido de que corria o risco de o Memorial ficar abarrotado demais.
Contudo, mostrei que não. A canoa foi colocada e os espaços até parecem ter
ficado maiores.
E realmente ficaram, e pelo simples fato de
que uma dependência que servia como quarto de dormir teve suas paredes
modificadas, as portas retiradas, e passou a servir como local para exposição
permanente da canoa. E completa.
E quem doravante visitar o Memorial vai logo
avistar a canoa toda bonita, pintada, com os panos em vermelho e amarelo, com
remo e até com uma tarrafa numa das laterais. O nome: Dona Peta, uma justa
homenagem a uma das mulheres mais singelas nascidas em Poço Redondo. E minha
falecida mãe.
Contudo, a presença da canoa no Memorial não
significa apenas uma embarcação como parte do acervo, pois muito mais,
envolvendo principalmente aspectos históricos e culturais da povoação e do
sertão sergipano.
Com efeito, num tempo onde a mata era senhora
e dona de todo o sertão, onde a vegetação nativa fazia pujança por todos os
quadrantes, somente através do Rio São Francisco, o querido Velho Chico, foi
possível o desbravamento destas terras inóspitas e desconhecidas.
O rio foi, efetivamente, o primeiro e grande
caminho dos sertões. Foi através de seu leito que despontaram as embarcações
com os primeiros habitantes. Foi nas suas beiradas que surgiram os primeiros
currais. Foi nas suas ribeiras que surgiram as primeiras povoações.
E a canoa simboliza tudo isso. Simboliza o
transporte do homem ribeirinho, seu meio de sobrevivência, seu objeto adorado
de uso. A canoa e o rio representam aqueles sertões molhados e que, mais
adiante, foram encontrando os outros sertões da terra seca, esturricada de sol.
A canoa simboliza ainda o viver ribeirinho em
toda a sua feição. O beiradeiro na sua lide de todo dia, ora lançando a tarrafa
ora colhendo seu fruto de sobrevivência. Canoa que sempre voltava cheia de
peixe, de frutos das margens, de esperanças e de tanta fé.
Desse modo, a canoa do Memorial homenageia o
sertão de beira de rio, o sertão dos currais ribeirinhos, o sertão das pequenas
povoações e aldeias de pescadores, o sertão nostálgico e saudoso demais.
Daí sua importante presença no Memorial.
Perante sua visão, certamente um livro aberto em páginas do passado, mas sem o
qual não seria possível a presença deste sertão de agora.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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