*Rangel Alves da Costa
Nada. Nenhuma voz. As folhas secas já não
passam. O vento já não assobia. As vozes do tempo e da natureza parecem
emudecidas. A boca providencialmente fechada. Nada caindo para cortar o
silêncio e fazer barulho.
Que bom se de vez em quando assim
acontecesse. O silêncio apenas, e a plenitude do silêncio, somente. Nada a
dizer a si mesmo no momento. Nenhum sussurro, nenhum murmúrio. A voz sem voz e
o grito maior do silêncio.
Assim mesmo, pois eis que de repente tudo
silencia e alguém começa a imaginar o nada existente. No silêncio o nada, o
vazio, o caos. E assim acredita por jamais ter ouvido ou sentido a sua palavra.
Sequer imagina que é do silêncio que nasce a
voz, que surge a ideia, que o mundo se expressa, que a vida se mostra. É, pois,
do silêncio que irrompe outro primoroso silêncio: aquele que necessita
silenciar intimamente para ser ouvido.
É no silêncio que a prece ecoa às alturas, é
no silêncio que o íntimo da alma procura sua razão de existir, que a pessoa se
reconhece enquanto força que precisa se reconhecer muito mais. E por isso mesmo
emudece para que outras vozes se soltem.
E uma verdade induvidosa: o silêncio é tão ou
mais valoroso que a palavra. Mais que isto, há no silêncio um ato de
comunicação tão intenso que se torna impossível não ouvir todos os gritos e
ecos.
O silêncio é a voz íntima, interiorizada, num
ato de comunicação da pessoa consigo mesmo. Mesmo sem a palavra dita,
verbalmente expressada, há a voz que interage do ser para com o ser.
O silêncio é a confissão sem medo e sem
demora. Em nenhum local ou instante da vida, o silêncio confessaria tudo o que
tem vontade de dizer senão no próprio silêncio. Não há receio de palavras,
apenas a voz no pensamento.
O silêncio nunca silencia. Mesmo que os
espaços estejam calmos, plenos de quietude, sem nenhuma outra voz, ainda assim
o silêncio vai busca no pensamento a palavra certa para o instante, num misto
de confissão, de recordação e de simples ou profunda meditação.
É no silêncio que o grito ecoa mais alto e a
voz brada seu uivo de lobo, mas apenas no próprio silêncio. Ora, vem a ideia,
vem a memória, vem a nostalgia, e daí todo um arroubo que se traduz em gritos e
brados.
Necessário que o ser humano silencie cada vez
mais. O mundo já possui alardes e alaridos em demasia, a vida já possui
algazarras e vozerios em demasia. E em instantes assim todo o silêncio se perde
em espanto.
Necessário por que o homem tem que encontrar
instantes para viver a si mesmo. Nenhum ser humano consegue viver sem ouvir
suas próprias vozes interiores e com elas dialogar suas razões, suas aceitações
e descontentamentos.
Necessário ainda que o homem silencie até que
encontre sua outra voz. De nada vale apenas abrir a boca sem que a palavra
surgida tenha valia. Nada adianta apenas falar se o expressado não possui sua
razão de ser.
No silencia há o sopesamento do verbo, da
expressão, daquilo que vai sair da boca enquanto palavra. Reflete-se no
silêncio sobre o acerto do que vai dizer. Medita-se no silêncio sobre a
validade e a necessidade do que irá expressar em palavras.
No silêncio há imagens, retratos, faces,
feições. No silêncio há molduras, cores, sorrisos, aflições, angústias,
tristezas. No silêncio há o som imaginário e tudo o que se deseje avistar. O
silêncio permite o reencontro.
No silêncio da brisa, do vento, da aragem do
entardecer, há muito além da palavra. Perante a brisa, a aragem e o entardecer,
logo o pensamento vai encontrando suas asas e tomando os espaços para seguir
nas distâncias.
Mas não precisa fechar a porta e a janela
para que o silêncio chegue. Não será necessária a reclusão para que o silêncio
se imponha. Longe da multidão e da voz, qualquer lugar serve ao silêncio,
principalmente quando busca no seu cantinho um instante de paz.
Então silencie e fale. Você precisa ouvir a
si mesmo.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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