*Rangel Alves da Costa
Mesmo sendo proibido em muitas cidades, em
muitos lugares é costumeiro encontrar pessoas vendendo veneno pra matar rato
pelas calçadas. Mesmo sabendo que algumas pessoas compram o produto para outra
destinação, e não raro para tentar contra a própria vida, continuam
comercializando sem qualquer importunação.
Pois bem. Estava um desses vendedores
anunciando seu produto, quando da esquina surgiu um sujeito todo entristecido,
cabisbaixo, parecendo desnorteado de tudo. Ao ouvir o anúncio do veneno pra
matar rato, logo ele apressou o passo naquela direção. Daí começaram a travar
um estranho diálogo.
“Senhor, deseja comprar veneno pra matar
rato?”.
“Sim. Quatro, cinco, uma quantidade grande.
Mas só mata rato mesmo?”.
“Não. Quer dizer... Não sei nem como
explicar, pois tem gente que usa pra outra coisa, que faz até maluquice...”.
“Não vai dizer que... Não, o senhor não tá
pensando em fazer besteira, né?”.
“Não. Não estou pensando em fazer besteira.
Estou pensando em fazer o que já deveria ter feito...”.
“O senhor está com algum problema?”.
“Sabe quando a pessoa está se sentindo
imprestável, no esgoto, como um ser imundo pra viver, um verdadeiro...”.
“Um verdadeiro rato?”.
“Sim, um verdadeiro rato. E como se mata um
rato?”.
“Com veneno de matar rato”.
“Sim. Quero morrer, não presto mais pra
viver, me sinto um verdadeiro rato...”.
“Mas rato grande ou pequeno?”.
“Por quê?”.
“Porque é pelo tamanho do rato que posso
saber a quantidade certa de tiro e queda”.
“Um rato qualquer, rejeitado do mundo...”.
“Rato de esgoto ou de cozinha?”.
“Por quê?”.
“Porque rato de cozinha é mais fácil de matar
do que rato de esgoto”.
“Não entendi...”.
“Rato de esgoto tem estômago mais forte e não
é pouquinho veneno que mata não. Então, como é o seu rato?”.
“Na verdade, nem rato sou, sou uma ratazana...”.
“Ratazana?”.
“Sim, sou uma ratazana abandonada pelo bofe.
Ele não deveria ter feito isso comigo, me deixando assim perdida na rua da
amargura”.
“Ah, agora entendi. É uma ratazana de esgoto
e abandonada...”.
“Sim, uma pobre e triste alma que vive a
vagar seus últimos instantes de vida. Dê-me todo o veneno que está aí...”.
“Vai levar tudo? Mas quer que eu lhe ensine
como usar pra ser tiro e queda?”.
“Não precisa. Vou tomar aqui mesmo.
Dê-me...”.
“Não. Aqui não. Pode morrer pra lá, mas aqui
não...”.
“Aqui sim. Dê-me logo senão eu grito que você
está me atacando...”.
“Endoidou?”.
Mas num descuido do vendedor, o sujeito
lançou mão de um embrulho de veneno e colocou tudo na boca. Depois mais outro e
mais outro.
Ante a situação, o vendedor tratou logo de
fugir do local. Não com medo que o sujeito morresse ali mesmo, e sim temendo
que ele descobrisse que o veneno era falsificado e que não matava nem rato nem
gente.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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