Rangel Alves da Costa*
Costumeiramente constava dos livros de História que eram tidos como bárbaros todos aqueles povos estranhos que repentinamente chegavam para conquistar territórios e povos desde muito assentados numa determinada região. Invadiram impérios, descaracterizaram culturas milenares.
Como nem sempre os tendenciosos historiadores explicavam detalhadamente as causas e as motivações das invasões, apenas as consequências injustas para os invadidos, por muito tempo também me fiz inimigo de vândalos, visigodos, ostrogodos, hunos, vikings, gauleses e outros bárbaros.
Enquanto bárbaros, os vândalos emprestaram o nome a diversas ações nefastas que se tem hoje. Diante do império romano nem pensaram duas vezes, foram invadindo, passando por cima de tudo, saqueando, destruindo o que encontrassem pela frente. Certamente tem algo a ver com certas torcidas organizadas, com marginais que fazem arrastões, com grupos armados na guerra do tráfico.
Mas a verdade é que até hoje o termo bárbaro soa negativamente aos ouvidos e mentes da maioria das pessoas. Logo chegam as conotações, as comparações e as ideias atuais que confluem no contexto de barbaridade. Neste sentido, tudo que é selvagem, medonho e truculento possui o requinte da atrocidade bárbara.
Não é à toa que o conceito atual – e mais usual - de bárbaro é o mais negativo possível. Assim, bárbaro é o indivíduo desumano, ignorante, que age com truculência e perversidade; é a pessoa de instinto cruel, agindo sempre com intimidação e violência; é tudo aquilo que se mostra como sádico, atroz, bestial, austero, bruto.
No contexto recente, bárbaros são os crimes praticados com requintes de violência; barbaridades são as indignações, as revoltas, as insurgências; barbaridades são as ações enlameadas e corrompidas propagadas por pessoas do alto poder político e governamental; barbaridades são todos os excessos, o que propositadamente se faz para subjugar o outro.
Mas para amenizar as conotações pejorativas tão difundidas, é que os jovens, nos seus modismos habituais, começaram a dar outro sentido ao termo bárbaro. Não que deixasse de prevalecer a noção impactante do termo, mas agora para significar aquilo que é excessivamente bom ou positivo. Então dizem da música bárbara, que paqueraram uma barbaridade, que as férias serão bárbaras.
Tanto aqui como acolá, tudo muito diferente do conceito histórico de bárbaro. Para os romanos e gregos, bárbaros eram todos aqueles povos que não tinham a sua cultura, não falavam sua língua. Tinham tais povos como rudes, incivilizadas, ignorantes. Eram de origem germânica e habitavam as regiões norte e nordeste da Europa e noroeste da Ásia, na época do Império Romano.
Há de ser observado um fator primordial neste aspecto, e diz respeito à mudança conceitual que um povo possa repentinamente passar a ter em relação ao outro. Ora, estes mesmos bárbaros viviam em paz com Roma, comerciavam, engrossaram muitas vezes o seu poderoso exército. Contudo, a partir do século IV, quando os hunos começaram a invadir - com brutalidade e violência sem precedentes - o grande império, então é que o termo bárbaro tomou realmente seu lugar na História.
Mas a verdade há de ser dita: os bárbaros não eram violentos nem se tornaram violentos perante os outros povos, principalmente os conquistados! Eles já eram agressivos, já eram reconhecidos pelas tribos vizinhas como extremamente arrebatados e impetuosos, de sangue quente, de pouco conversa e muita brutalidade. Nas suas hordas, formadas por rudes cavaleiros, não havia outro senso comportamental senão o de enfrentar o inimigo da maneira mais violenta possível.
Daí indagar: o conceito de bárbaro é uma questão cultural ou não? Ao não se reconhecer o comportamento de um povo como gestação própria, enraizada nos seus modos de pensar e agir, e por isso mesmo com plena validade de ação, ainda que aos olhos dos outros não passem de vis seres humanos, seria o mesmo que afirmar dos crimes praticados pelos canibais, do infanticídio indígena, ou perante diversas culturas com seus sangrentos ritos de passagem.
Tudo é uma questão cultural, de entender o outro dentro do seu contexto, e não perante os olhos conceituais do mundo. Portanto, aqueles bravos guerreiros, aguerridos lutadores, nem de longe devem ser comparados aos bárbaros atuais. O que o termo atrai, a verdadeira História faz a devida e correta separação.
Poeta e cronista
e-mail: rac3478@hotmail.com
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