*Rangel Alves da Costa
Outro dia, o jornalista e escritor Marcos
Cardoso escreveu um artigo esclarecedor acerca da situação financeira de muitas
prefeituras, suas receitas e seus poderes de sobrevivência para, em síntese,
dizer que verdadeiramente não há motivo pra tanto chororô. Segundo o
articulista, os recursos repassados logo afastam a situação de penúria e de
calamidade. Na verdade, segundo diz, prefeitos existem que choram de barriga
cheia. E com plena razão de análise. É bem assim mesmo.
Já escrevi sobre tal dramaticidade espertalhona.
Igualmente escrevi sobre a conta da eleição em comparação ao salário na junção
dos quatro anos de mandato. O que se tem é a clara intenção de alardeamento da
penúria municipal para encobrir muitas coisas, dentre as quais a gestão
ineficiente, a falta de obras que atendam às demandas da população, o
depauperamento da municipalidade, mas, principalmente, o enriquecimento do
gestor e de seus escolhidos. Ora, como é que um município tão empobrecido tem o
poder de enriquecer alguns, e em pouco tempo?
O alardeamento de que o município é pobre,
que os recursos são insuficientes para a realização de obras, que a situação
financeira do país empobreceu os cofres municipais, e outras desculpas para o
nada fazer, é tudo conversa pra boi dormir, não passa de embuste e enganação. As
situações são corriqueiras e inaceitáveis. Assim que um gestor assume logo vão
chorar rios perante a imprensa, sempre dizendo que os cofres foram encontrados
vazios e que não sabem o que fazer daí em diante. Mas os cofres, segundo
continuam dizendo, continuam sempre vazios. Por outros motivos que eles nunca
dizem.
Numa analogia pitoresca, não seria errôneo
dizer que administrar atualmente é quase como uma receita de bolo, só bastando
não querer trocar os ingredientes, como faz a maioria. Grande parte dos
recursos já chega especificado. Recursos próprios para a educação e outros
setores, mas que de repente tomam outro rumo como num passe de mágica. Recursos
são tirados de alguns fundos para cobrir outros, e assim em diante. Daí faltar
merenda e gasolina para o transporte escolar, quando os recursos já foram
repassados. Daí a não realização de obras com verbas já garantidas.
Alardeia-se a penúria por esperteza, apenas
isso. Espalham a desgraça e a crise apenas como modo de ocultar outras realidades.
Municípios pobres e prefeitos ricos, municípios caindo aos pedaços e gestores
comprando fazendas em outros estados, municípios vivendo à míngua e
administradores zombando da população com seus desregramentos e luxos e
esbanjamentos descomunais. E será que apenas com o salário recebido – que
sempre é vultoso para a realidade – daria para um gestor enriquecer tanto assim
e com rapidez de raio? Alguma coisa de podre há no reino da municipalidade,
disso não há como duvidar.
Até hoje ainda não apareceu nenhum enviado
dos céus que se candidate a prefeito apenas por abnegação, pelo gosto ao
trabalho e o amor à municipalidade. Todos que se candidatam possuem intenções
maiores – e sempre misteriosas – além da simples vitória. Os objetivos são
sempre outros, e obscuros, muito obscuros, Ou desavergonhamento mesmo, na mais
pura expressão da palavra. É o olho na viúva que sempre move a disputa. Segundo
a sabedoria popular, viúva é a denominação comumente dada às prefeituras
municipais, e por motivos tão conhecidos como melindrosos.
Viúva rica, generosa e graciosa. Viúva que é
sonho de todo amante, pois nela o poder, a riqueza e o fausto. Viúva de breve
relacionamento – ou de mandato amoroso com tempo determinado -, mas que sempre
garante sair de seus braços de anel dourado e conta polpuda. A viúva, caridosa
demais que é, permite praticar nepotismo, praticar um vergonhoso joguete de
empreguismo. Quem é que não quer uma viúva que de tão boa lhe entrega as chaves
dos cofres? Assim acontece com a viúva da municipalidade, aquela velha senhora
tão desejada e que recebe o nome de prefeitura.
Para alcançar suas chaves se faz de tudo. A
mentira é sempre o maior mote. A mentira da honestidade, das boas intenções, da
vontade de trabalhar, do respeito ao povo e ao município, do senso
transformador, da ética e do compromisso com o trabalho. Todo candidato diz
isso, mas quantos eleitos perseguem a dignidade e a decência? Ora, um candidato
que para ser eleito gasta o equivalente a dez vezes mais do que vai ganhar no
seu tempo de gestão, logo estará demonstrando suas reais intenções.
Prefeituras existem que são verdadeiras
organizações criminosas nas mãos de gestores mestres na rapinagem. Cosa Nostra
seria um termo mais apropriado. Ao invés de administrar com decência e
honestidade, os gestores transformam as prefeituras em grandes máfias, onde o
capo é o prefeito e alguns escolhidos servem como sottocapos, consiglieres e
soldatos. Todos ladrões. Formam uma famiglia cujos sustentáculos de roubalheira
estão nas licitações viciadas, no patrocínio de shows, na transformação da
merenda escolar em bolacha e ki-suco, nos desvios de verbas para contas
bancárias particulares, dentre outras práticas insidiosas.
Em Sergipe, estado pequeno onde o ouvi dizer
chega acompanhado da confirmação visual, é muito fácil perceber a ostentação, o
enriquecimento ilícito e a riqueza camuflada, repentinamente surgida nas
pessoas que fazem parte das administrações municipais, incluindo familiares dos
gestores. A realidade é essa, incluindo as perseguições e as ameaças a todos
que ousarem dizer que o preito beltrano ou sicrano não é santo.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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