*Rangel Alves da Costa
Gosto é gosto. Ouça a canção que quiser. Mas
meu canto é sertanejo, é aboiado, é toadeiro, tem cheiro de mato e de bicho,
ecoa mugindo, berrando, sacodindo folha de catingueira. Meu canto é rimado na
pega-de-boi, no alazão galopante, no vaqueiro encourado e no sopro fumacento do
boi valente. Meu canto tem gibão e perneira, tem peitoral e chapéu de couro,
tem cheiro de suor sertanejo e rosto lanhado de mato afiado. Meu canto é
destemido, atrevido, um fi da gota de bom. Vem de longe e de pertinho, está ali
e acolá. Boi ouve e canta meu canto, vaqueiro ouve e sabe que o meu canto é sua
vida, sua história, seu prazer na vaqueirama. Meu canto é matuto, sertanejo,
das brenhas espinhentas. Ecoa na florada do mandacaru e no amarelado da flor da
jurubeba. Meu canto é assim, aquele mesmo cantar da Santa Fé, da Juazeiro, da
Padre Cícero, das ruas em cavalgadas e dos parques de vaquejada. Meu canto vem
da voz de Geno, Antônio Neto, Niltão e muitos outros cantores e aboiadores. Meu
canto não é de palco não, não requebra nem rebola, não é de sofrência nem de
paixão cachacenta. Ora, meu canto não tá no rádio nem na vitrola como coisa
fútil, passageira e vulgar, mas ecoando nos sertões desde os tempos mais
antigos. Meu canto não vem de um paredão nem de uma mala aberta de som
vergonhoso. Não, isso não. Meu canto é sublime, é singelo, é tão belo que até a
aroeira se comove ao ouvir meu cantar. Meu canto é o aboio, é a toada, é a voz
do vaqueiro, é o eco de um povo em comunhão com sua vida vaqueira. Quem quiser
cante comigo. Quem quiser ouça comigo. Garanto, então, que a história cantada
não entrará e sairá pelos ouvidos, mas se guardará com alegria bem dentro do
coração.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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