*Rangel Alves da Costa
A fome é humilde, pede qualquer coisa, aceita
quase tudo. A fome é sem luxo ou riqueza, é serviçal e não rainha, é vassala e
não burguesa. A fome é pedinte calma, submissa, apenas esperançosa. A fome
verdadeira jamais é arrogante, exigente ou de esnobês. O prato da fome não é de
cristal, não é de porcelana, não é de ouro nem reluzente à mesa. O prato da
fome é qualquer prato, é qualquer mão, é qualquer cuia, é qualquer estanho, é
qualquer coisa. A fome não sabe o que é menu, cardápio ou lista a escolher. A fome
não é macarronada, a fome não é churrasco, não é strogonoff, não é fígado
acebolado ou galinha caipira, não é bife requintado ou pernil assado. A fome é
qualquer coisa, num prato de qualquer jeito, sem muito nem pouco, mas quase
tudo que se oferece. A fome se alegra com o pão, com o arroz, o macarrão, com o
pedaço de carne, com a bolacha e o bolachão. A fome se farta sem luxo, se
assume tão humana que desconhece sobremesa ou gula de querer sempre mais. Mas
somente a fome verdadeira, não aquela que pede por pedir e ainda exige
quentinha ao invés de pão. E ainda assim há tanta fome sem prato, sem mesa, sem
resto de qualquer coisa, sem um só grão de doação. Há uma fome que é tão fome
que assim permanece em muitos, que assim esvazia em muitos, e a muitos mata sem
qualquer grão, sem qualquer pão. E o que a vida tanto desejava era um prato de
qualquer coisa. Ou um resto, ou um pedaço, ou um grão de qualquer coisa.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário