*Rangel Alves da Costa
Antes mesmo dos anos 70, principalmente a
partir da primeira gestão de Alcino Alves Costa (1967-1970) no comando da
prefeitura de Poço Redondo, os laços de amizade entre o jovem prefeito e os forrozeiros
Clemilda e Gérson Filho foram muito estreitados, tendo este casal uma porta
sempre aberta no sertão sergipano.
Clemilda e Gérson Filho, nascidos nas Alagoas
e migrados para Sergipe após uma breve estadia no sul do país, já eram
reconhecidos nacionalmente quando Alcino abriu-lhes as portas de Poço Redondo.
Antes disso, o contato dos artistas com o sertão era apenas no vai e vem das
raras apresentações, para mais tarde se transformar em constante convívio.
Ora, desde aqueles tempos que Alcino se mostrava
um apaixonado pela autêntica música da terra, tanto no forró como na viola de
pinho. E tal paixão redundou na maior festa forrozeira já vista no sertão
sergipano. Foi naqueles idos dos meados de 70 que nada menos que doze artistas
famosos chegaram a Poço Redondo para uma inesquecível apresentação.
O “Fino da Roça” estava em Poço Redondo.
Festança de rua, tomando a extensão da atual Rua Prefeito João Rodrigues, tendo
a carroceria de um caminhão como palco, nomes famosos como Elino Julião, João
do Pífano, Messias Holanda, Pedro Sertanejo, Genival Lacerda, Clemilda e Gérson
Filho, dentre tantos outros, tornaram inesquecível aquela noite sertaneja.
Foi nesta estadia que Messias Holanda
encontrou o mote para compor (a partir de ideia de Alcino) um de seus grandes
sucessos: Mariá: “Pra onde vai com essa trouxona danada Mariá, na cacimba só
tem água pra beber. Pouca água deixa a roupa mal lavada Mariá, lavar roupa,
também tem o que aprender. Bota pouco pano nessa trouxa Mariá, nesse tempo não
tem água pra gastar. Leve a colcha eu preciso dessa colcha, abra a trouxa, bote
a colcha, leve a colcha pra lavar...”.
A Mariá da música ainda pode ser avistada ao
frescor do entardecer na calçada de sua filha Neide, precisamente na Avenida
Alcino Alves Costa. Também exercendo o ofício de lavadeira no passado e
residindo noutro local, Alcino passou com Messias Holanda no exato momento em
que Mariá seguia com uma trouxa de roupas na cabeça. E daí ter nascido a música
que tanto sucesso fez e hoje se constitui em relíquia sertaneja.
Mas como dito, Clemilda e Gérson Filho
passaram a ser presença constante em Poço Redondo e em tamanha amizade com
Alcino que se tornaram como se fossem “de casa”. E foi como reconhecimento
dessa amizade que Gérson Filho incluiu no LP “Ingazeira do Norte”, de 1969, o
“Forró em Poço Redondo”. A composição dessa música deu, contudo, o que falar,
correndo até o risco de se transformar em verdadeira tragédia entre dois
forrozeiros.
As desavenças em torno do “Forró em Poço
Redondo” ocorreram entre o próprio Gérson Filho e outro famoso forrozeiro,
alagoano de Traipu, mas sempre no sertão sergipano, chamado Dudu Ribeiro. Além
de seu terno de linho branco, baixa estatura, chapéu grande e imponente, e
maestria na sanfona, Dudu Ribeiro era conhecido e afamado pela sua valentia.
Diziam até que tocava com uma arma escondida debaixo do chapéu.
Pois bem. Sendo também presença constante em
Poço Redondo, o sanfoneiro Dudu Ribeiro procurou homenageá-lo com um forró, e
assim surgiu o “Forró em Poço Redondo”. Um dia de festança no sertão, eis que
encontra seu amigo Gérson Filho e começa a dedilhar sua criação. Então
prontamente Gérson pede para gravar. Concessão feita, este fez alguns ajustes
nos acordes e lançou em disco. Só que Gérson cometeu um erro imperdoável: não citou
Dudu sequer como parceiro de composição. Até hoje consta apenas o nome de
Gérson Filho como compositor.
Quando soube do acontecido, então Dudu
Ribeiro virou na gota serena. Valente só bicho do mato, multiplicou sua
valentia em muitas e jurou acertar as contas com Gérson. Não ia ficar barato
não, segundo ele. Foi preciso que Alcino prontamente intercedesse para não
acontecer o pior. Não se sabe o que ficou acertado ou como foi resolvida a
questão, mas o “Forró em Poço Redondo” ganhou ainda mais fama após tal
episódio.
Mas outro episódio, desta feita envolvendo
Clemilda, mostra que a errônea atitude em não citar os verdadeiros compositores
parecia normal ao casal de forrozeiros. A música “No sertão tudo mudou” possui
letra de Alcino Alves Costa, mas no disco consta apenas Clemilda e Gérson Filho
como autores. Ainda bem que não ocorreu o mesmo com o sucesso “Seca Desalmada”,
que deu nome ao LP de 1973. Tal música composta por Alcino se tornou num dos
maiores sucessos de toda a carreira musical da guerreira alagoana de alma
sergipana.
De uma plangência sem igual, a voz afinada
perante a letra genial: “Visitei o Juazeiro que fica lá no sertão, havia muito
romeiro assistindo um sermão...”.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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