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sábado, 21 de janeiro de 2012

ESTÓRIAS DOS QUATRO VENTOS: A VELHA CAFETINA E O CORONEL (O ÚLTIMO TRAGO NO BORDEL)

ESTÓRIAS DOS QUATRO VENTOS: A VELHA CAFETINA E O CORONEL (O ÚLTIMO TRAGO NO BORDEL)

                                          Rangel Alves da Costa*



Conto o que me contaram...
Dizem que nos idos da segunda metade do século passado, os últimos coronéis cacaueiros e os latifundiários sertões adentro já estavam dando os seus últimos suspiros. Um tempo de mandonismo, do poder a ferro e fogo, da tocaiagem e jagunçada traiçoeira, estava inadiavelmente se dissipando.
Do mesmo modo os grandes e afamados bordéis, mantidos principalmente pelas notas graúdas dos senhores de terras e gente. Mas também pelo comparecimento de políticos de renome, jornalistas, escritores e boêmios de todas as espécies. Pé rapado não, gente qualquer não tinha acesso ao luxo das casas insuspeitas das grandes madames, rampeiras quando mais jovens, mas que foram se transformando em aclamadas cafetinas.
Os grandes bordéis começaram a perder sua força, as grandes cafetinas deram lugar a meras agenciadoras de mulheres de vida fácil, como se costumava dizer. Os coronéis rareavam na mesma proporção que a violência deixava de comandar a vida nos lugarejos interioranos, redutos maiores do poder e de mando desses homens que construíram riquezas com o sangue derramado de inocentes.
Uma ou outra madame, apenas por saudosismo e por não ter pra onde ir, mantinha seu bordel de portas abertas, porém sem clientes de luxo e muito menos com prostitutas afrancesadas vindas diretamente dos pacatos interiores. Uma vez no prostíbulo, a beleza cabocla era transformada em mimosices e passavam até a falar fazendo biquinhos nos beiços.
Coronel gostava disso, e por isso mesmo gastava numa só noite uma dinheirada estupenda, pequena parte de uma boa safra cacaueira. A madame gostava disso, gostava do cheiro de sexo e de charuto, dos perfumes exalantes e dos uísques derramados até a borda dos copos. Mas os tempos agora eram outros.
E assim um coronel, talvez o último coronel dos sertões cacaueiros, já com seu terno de linho branco um tanto surrado e chapeu sem o cuidado de antigamente, chegou sozinho e entristecido ao último bordel que existia no lugar e foi logo sentando numa mesa. O local estava totalmente deserto, sem qualquer prostituta atrás das cortinas ou mesmo quem lhe viesse servir um trago.
Colocou o chapéu e a bengala por cima da mesa e chamou alguém em voz alta. Madame apareceu numa porta no mesmo estado que ele, envelhecida e já sem aquele encorajamento e festejo tão peculiares ao receber os melhores clientes. Mas estava bem vestida e bem pintada, exageradamente tomada de cores que quase desfiguravam sua feição.
Aonde estão as meninas, perguntou o coronel. Há muito, e você sabe bem disso, que a única menina que restou aqui sou eu. E por isso mesmo me enfeito toda esperando você chegar, pois mais cedo ou mais tarde você é o único que chega. Respondeu a mulher, abrindo o último litro de uísque barato que restava.
Então vamos falar de outros tempos, daqueles tempos bons quando isso aqui vivia cheio de carne macia e de gente endinheirada. Disse o coronel, colocando bebida num copo. Não coronel, não vamos falar disso não. Prefiro falar de nós dois. E ela tomou o trago mais realista de sua vida.
Não, não chore minha velha quenga. Falou baixinho o coronel, passando a mão ao redor dos olhos dela, tão pintados e cheios de lágrimas.




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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