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sábado, 7 de janeiro de 2012

ZABÉ CANGACEIRA (Crônica)

ZABÉ CANGACEIRA

                                          Rangel Alves da Costa*



Ainda falta muito de tudo que já contaram, pois veja só que estripulia de estória é essa que me asseveraram ter acontecido lá pelas bandas do sertão mais distante. Mas vou contar como sei, como quero contar.
Verdade é que o cangaço sempre despertou interesse no sertanejo, seja pela intrepidez do bando de Lampião, seja pelas façanhas contadas de boca em boca, num irrealismo tamanho que parecia coisa do outro mundo. Daí ser também verdade que o sonho de muitos era ser cangaceiro, espalhar sangue e revolta pelos sertões, lutar pelo que nem sabiam.
Mas Zabé foi cangaceira, ganhou fama de justiceira do sertão, de mulher audaciosa e destemida, sem jamais ter colocado um pé nas entranhas da mata nem dormido por cima de espinho e debaixo do luarar. Depois seguiu a vida bandoleira, é verdade, mas primeiro teve que fazer sozinha sua fama de valentona e arrelienta.
Coisa de se estranhar, mas a verdade é que de repente a mulher, ainda jovem e graciosa igual a flor de mandacaru, e largada do marido por conta própria - por não suportar traição segundo ela - começou a ser chamada de Lampioa, cangaceira, bandoleira, muié home. Ela não gostava de nada disso, mas engolia a seco para manter uma postura ainda maior de propósitos.
E tudo começou quando ela descobriu que seu marido andava lhe traindo com uma e com outra, num descaramento de não acabar mais. O que acabou foi o casamento, pois ela juntou tudo do safado num saco e jogou na porta da rua. Ele quis reclamar, achar ruim, se defender, mas teve que sair com o rabinho entre as pernas e uma velha espingarda na sua mira.
A valentia da mulher despertou a atenção de outras mulheres, igualmente vítimas das safadezas e traições de seus maridos. E em romaria seguiam até a casa de Zabé para pedir ajuda sobre uma desfeita, uma danação do esposo ou coisa parecida. Então, a cada visita, Zabé perguntava a cada uma se tinha coragem de formar uma frente de batalha para expulsar do lugar todo homem galinha e toda mulher casada que abria as pernas pra outro cabra. Vixe Maria, a danação tava feita!
Com a geral aceitação, o grupo foi formado e a líder começou a planejar as ações, verdadeiras estratégias de guerrilha. Cataram trabuco, espingarda velha, garruncha, baleadeira, pedaço de pau, taca de couro cru e o escambau e se preparam para agir, para o enfrentamento. E o que se viu depois foi um deus-nos-acuda no lugarejo e sertão adentro, com cabra a correr de perder o chinelo, mulher safada desandar no mundo com pouca roupa, muitas vezes só a parte de baixo.
Uma zinha viu que não tinha jeito e se danou a correr, a gritar e a chorar, nuazinha como veio ao mundo. Mas que coisa mais feia, pois quanto mais corria mais aquela pelanquice parecia querer se desprender e se desfazer pelo ar. Já outra, vaidosa demais e faceira de fazer inveja, preferiu ser expulsa do lugar mansamente, parecendo que caminhava numa passarela, ainda que tomando lapada na bunda e varada nos quadris.
Não demorou e o bando de Zabé, agora chamada em bom som de Zabé Cangaceira se deu por satisfeito. Porém quando a valentona resolveu dar outro destino à vida tudo voltou ao normal, se não ficou ainda pior.
Muitas daquelas que expulsaram seus maridos a varadas deram pra quengar de tal forma que o lugar parecia um cabaré. Tentavam justificar a sem-vergonhice afirmando a falta de homem, vez que não deveriam ter expulsado seu safadinhos daquele jeito. E na falta deles só outros, ainda que casados.
Mas Zabé não estava mais por lá para fazer nada, mudar aquela situação vergonhosa, aquela putaria toda. A danada já fazia parte do bando de Lampião, convidada que havia sido pelo próprio Capitão. E o pior que lá se engraçou pelo líder e assim que Maria Bonita percebeu a chegança, deu-lhe uma surra de cansanção junto com garrancho de catingueira que até hoje a ex-valentona se coça no oco do mundo.



Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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