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quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

DAS IMPERFEIÇÕES (Crônica)

DAS IMPERFEIÇÕES

                      Rangel Alves da Costa*


Toda perfeição é uma impressão psicológica momentânea daquele que vê ou sente. É simplesmente a primeira aparência favorável sobre tudo. Disso não tenho dúvida. E não o tenho porque não há nada perfeito na vida. Disse na vida e não envolvendo o esmero superior que em tudo habita.
Aquilo que se tem como perfeito muitas vezes não se sustenta como tal a partir de um segundo olhar. O próprio tempo é hábil em mostrar as imperfeições daquilo que é considerado perfeito. Não há nada, pois, que se mantenha na sua integralidade de apuro e beleza por toda a vida.
Por mais que o artista retoque sua obra, pincele ali e acolá, aumente ou diminua a luminosidade, ainda assim tencionará em fazer mudanças todas as vezes que estiver diante de sua criação. E diz a si mesmo que se pudesse pintaria tudo novamente, muito do que existe ali deixaria de ser.
Por mais que o indivíduo procure fazer tudo certinho na vida para amanhã não se encher de arrependimentos, e realmente faça tudo brilhantemente, com grande sucesso e prazer, mais tarde sempre dirá que se pudesse voltar no tempo faria de forma diferente muito daquilo que um dia foi visto com tanta perfeição.
Se voltasse o tempo de criança, diz a música; se um dia eu pudesse ter meu passado inteiro, diz a outra; e mais uma diz que tempo bom era aquele da molecada, da correria livre atrás de uma bola de meia, do fazer tudo sem se importar com nada. Mas se houvesse uma chance de voltar atrás, ainda assim tudo seria feito segundo as circunstâncias do tempo. E depois apenas a certeza de que tudo poderia ser feito de maneira diferente, melhor, mais bem feito.
Disso tudo se depreende que o ser humano vive em constante insatisfação, em permanente negação do presente. Toda vez que diz que hoje faria de outro modo o realizado ontem é porque mostra sua incapacidade de realizar plenamente, sua fragilidade nas realizações, seu amadorismo nas ações. E com isto, erroneamente, quer afirmar-se como capaz de não errar mais, errar menos, ou fazer tudo com perfeição.
O problema é que essa certeza de hoje, dessa destreza em fazer o melhor, será novamente negada amanhã. Verdade é que o esmero de hoje, a maravilha que se faça hoje, amanhã será refutado, colocada em xeque, já visto como algo que não saiu como deveria. Por exemplo, se for dada a chance de refazer o ontem com a sabedoria e o conhecimento de hoje, amanhã uma nova experiência no indivíduo irá mostrar que poderia ter feito bem melhor.
Mas tudo tem sua razão de ser. Logicamente que o amadurecimento do indivíduo traz à sua mente novas percepções de realidade. Essa possibilidade maior de realização que se passa a ter não vale, contudo, senão daquele momento para trás, regredindo ao passado. O indivíduo se espelha diante do ontem para sentir suas imperfeições, porém não pode dar um salto perceptivo e realizar agora para mais tarde não se arrepender.
Mais tarde, com o novo cabedal perceptivo adquirido, então virá a conscientização de que não adiante se achar o suprassumo, apto a realizar com perfeição, e simplesmente porque a perfeição nunca se completa e tudo na vida não passa de meras realizações que podem ser aprimoradas sempre. Pensar diferente seria o mesmo que dizer que se estivesse vivendo na idade da pedra lascada iria ter a ideia de colocar câmera de vigilância na entrada da toca.
Portanto, as imperfeições existem para que o ser humano procure se aproximar ao máximo da perfeição. Como nunca conseguirá, cada passo quer der para melhorar o já realizado será um grande avanço pessoal e para a humanidade. Quando não se alcança tal objetivo é porque as lições de ontem serviram de nada. E o mundo continuará tão imperfeito quanto o próprio homem.



Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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