*Rangel Alves da Costa
Ali no
Alto de João Paulo, logo após a passagem molhada que separa a cidade de Poço
Redondo, no sertão sergipano, da importante e histórica comunidade, distando
apenas cerca de dois quilômetros desde o centro urbano, avista-se a casa onde
morou Maria Adília de Jesus, a cangaceira Adília, companheira de Canário nas
lides cangaceiras, e irmã do também cangaceiro Delicado (João Mulatinho).
A
ex-cangaceira era mulher alta, esguia, de amorenado forte, cabelos escorridos,
de poucas palavras, mas sempre cordial e amigueira. Diferentemente da
ex-cangaceira Sila (espalhafatosa, conversadeira, cheia dos luxos e dos
requintes), Adília, até mesmo por ser humilde e viver na humildade, era pessoa
de absoluta simplicidade. Não falava de seu tempo de cangaço nem se arvorava do
que havia sido. Quem a visse era como se nada sobre aquela mulher guardasse
tantos segredos e tantas histórias.
Adília entrou
para o cangaço com menos de dezesseis, influenciada pelo grande amor de sua
vida, o conterrâneo e também cangaceiro Canário (Bernardino). Como a sua
família não aceitava o namoro, a menina prometeu ao namorado que iria com ele
até o inferno se fosse preciso. E foi. Em 36 seguiu com ele para as agonias
entre os açoites das balas e os espinhos sangrentos do mandacaru.
Também
dessa comunidade do Alto é a origem de outros quatro irmãos cangaceiros: Sila
(Ilda Ribeiro de Souza), Novo Tempo (Du), Mergulhão (Gumercindo) e Marinheiro (Antônio),
filhos de Paulo Braz São Mateus, pai do famoso vaqueiro e homenageado João
Paulo, por isso mesmo a denominação atual de Alto de João Paulo. Por todos
aqueles arredores há um histórico de participação cangaceira, tivesse sido como
cabra de Lampião, coiteiro ou participante ativo naquele mundo sertanejo
carregado de sangue, valentia e sofrimento.
A família
de Adília, do tronco dos Mulatinho, possuía parentesco com a família Braz São
Mateus, de Sila e demais, e ainda hoje a comunidade é formada pelas raízes
vingadas daqueles primitivos habitantes. Parentes de Adília e Delicado, bem
como de Sila, Novo Tempo, Mergulhão e Marinheiro ainda estão por lá. Outros
arribaram para o centro urbano mais adiante, mas todos ainda compartilham, um
tanto orgulhosos e sem medo, do sangue famoso que carregam nas veias.
Pois bem,
esta a casa de Adília, de cor esverdeada e porta e janela à frente, levantada
no tijolo e cimento, é hoje habitada por familiares. Contudo, a ex-cangaceira
nem nasceu nesta residência nem nela habitou logo após sua saída do cangaço. A
originária casa dos Mulatinho era no barro e cipó, na simplicidade sertaneja de
então. E ao retornar a seu berço de origem, após as durezas dos embates
cangaceiros, foi também numa casinha de barro e cipó que a valente mulher fixou
moradia, do outro lado de onde hoje está a moradia que fez de lar até falecer
em março de 2002, aos 82 anos.
Desse
modo, todo aquele que por interesse histórico ou mesmo para uma visita e
conhecimento da comunidade do Alto, basta atravessar a ponte do riachinho e
seguir adiante, e a casa logo estará visível ao olhar. Atualmente desconhecida
ou vista apenas como mais uma casa ali do Alto, mas guardando dentro de si um
relicário de históricas recordações e saudades muitas.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
Um comentário:
Parabéns pela postagem sobre a casa da cangaceira Adília. Ninguém nos mostra a casa de José de Julião, Mané Félix, Antonio de Chiquinha...
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