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segunda-feira, 18 de outubro de 2010

ABISMOS E ABSURDOS (Crônica)

ABISMOS E ABSURDOS

Rangel Alves da Costa*


Como se não bastassem as dificuldades que a vida apresenta para que o ser humano possa sobreviver, este mesmo ser supostamente consciente, responsável por atos e atitudes, parece achar que são poucas as dores e sofrimentos, e vive construindo abismos e vive praticando absurdos.
Para que tais pessoas possam lembrar, abismos são precipícios profundos, buracos imensos a se perder de vista, poços profundos, profundezas que exemplificam a derrocada na vida por ter submergido num mundo aparentemente sem saída. Estar à beira do abismo significa estar perto da destruição.
A Bíblia cuida do abismo, dentre outras passagens, nas seguintes citações: "o abismo os cobriu; afundaram-se nas águas como pedra" (Ex 15,5); "Abre um fosso profundo, mas cai no abismo por ele mesmo cavado" (Sl 7,16); "Não me deixeis submergir nas muitas águas, nem me devore o abismo. Nem se feche sobre mim a boca do poço" (Sl 68,16); "Vós me lançastes em profunda fossa, nas trevas de um abismo" (Sl 87,7); "Cuida de ti e presta bem atenção aos teus ouvidos, pois caminhas à beira de um abismo" (Eclo 16,18).
Por sua vez, absurdos, na linguagem comum, são atos que não faz nenhum sentido o ser humano praticar; algo que foge à normalidade das coisas; o que é contrário à razão ou que está para além dos limites da racionalidade; aquilo que é desprovido de propósito, sem nexo, inaceitável e contrário às regras estabelecidas pela sociedade. "Entre os profetas samaritanos vi absurdos: profetizaram em nome de Baal e desencaminharam meu povo de Israel", diz a Bíblia em Jeremias 23,13.
Mas vejo também absurdos nas famílias que deixaram de educar os seus filhos para as situações da vida e preferem entregá-los aos acasos do mundo; às incertezas nos circos cheios de feras; à própria sorte ou ao destino, que é traçado para o bem, mas pode ser encaminhado para o mal. Porque possuem frágil discernimento, logo são atraídos para os piores caminhos.
Mas vejo verdadeiros abismos diante dos pés desses jovens que, sob o propósito de que vale a pena testar ou experimentar tudo na vida para ver o que é bom ou ruim, se atiram aos vícios e aos perigos, se jogam impiedosamente nos caminhos daqueles que só querem transformá-los em seres sem futuro algum, dependentes da prática do mal para sobreviverem e quase mortos ainda vivos.
Absurdos podem ser avistados no convívio desumano da sociedade; na total falta de amizade e na proliferação dos ódios e das traições; naqueles que enxergam todos os outros como seus inimigos, como seus adversários e desafetos, e por pensarem assim fazem de tudo para destruí-los; no mais novo que vê o mais velho com desdém e descaso; no mais velho que finge não ter aprendido as lições passadas e continuam errando como jovens irresponsáveis.
Abismos vejo na juventude que não se contenta com o que tem e passa a vender até o seu corpo para adquirir aquilo que os modismos mandam; vejo nas ferramentas nas mãos dos pais, que evitando enxergar os desvios comportamentais dos seus, o que procuram é cavar o mais rápido possível o buraco por onde eles deverão entrar para sempre; vejo nos exemplos que muitos pais dão aos filhos, que por já estarem com as águas submersas até a cabeça só levantam as mãos para arrastá-los também.
Sinto que os absurdos se mostram cada vez mais claramente, expondo também suas consequencias, mas mesmo assim é cada vez maior o número daqueles que deixam de viver como realmente são, com respeito e dignidade, para viverem da imitação do pior que é imposto pela televisão, pela mídia, por todos os meios de comunicação. Não sabem que a trama da novela é ficção, mas o fim trágico de suas vidas não.
Sinto que os abismos não são mais tão profundos como imaginávamos, nem tão escuros como pensávamos. Basta sair às ruas, basta olhar a esquina, basta olhar nos olhos, basta enxergar os restos.
O pior é que na linha do tempo, que avança em tudo e cada vez mais, tudo isso ainda é o mínimo do que se verá daqui por diante. Não é profecia, mas deliberação, escolha do próprio homem.




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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