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domingo, 24 de outubro de 2010

ZEZINHO NO MUNDO E O MUNDO DE ZEZINHO – 5 (Conto)

ZEZINHO NO MUNDO E O MUNDO DE ZEZINHO – 5

Rangel Alves da Costa*


"Ei pivete, chispa daqui, certamente tá olhando pra querer roubar...". Disse o dono da padaria com cara de poucos amigos.
"Eu querendo roubar? Não sei nem o que é isso, seu Zé. Meus pais me disseram que roubar é um pecado muito grande e uma coisa muito feia da pessoa fazer. É dez vezes melhor pedir do que pegar no que é dos outros. E se a gente pedir e a pessoa não der, mesmo assim não se deve roubar de jeito nenhum. E mais, seu Zé, se eu fosse de roubar não tava aqui olhando o seu pão não, já tina entrando, pegado um e saído correndo...".
Respondeu Zezinho ainda em pé no mesmo local onde havia sido confundido pelo padeiro. E falou sério demais para que o vendedor não desse importância ao que ouvia. E porque ouviu muito bem foi que falou ao menino:
"Suba aqui, venha cá. Não tenho medo não, venha cá...". E Zezinho entrou na padaria e seguiu em direção ao balcão onde estava o moço. "O que é que o senhor quer, perguntar de novo se estou querendo roubar?", indagou.
"Deixe pra lá molecote. Gostei da seriedade nas palavras, provando que é um bom filho e um bom menino. Mas pelo jeito você não veio comprar nada, talvez não tenha um só tostão. O que vejo em ti, guri, é uma carinha de quem está com fome. Está com fome, não é mesmo, e por isso estava de olho arregalado naquela bisnaga, não é mesmo?
O dono da padaria agora se mostrava amigueiro, compreensivo, acertando direitinho no pronto fraco de Zezinho, que naquele momento era a fome. E este falou:
"Essa hora lá em casa eu já tinha comido qualquer coisa, nem que fosse uma caneca de leite com farinha ou um bolachão de muitos dias. Tô com fome porque não tô em casa, porque se tivesse lá nem dava vontade de olhar pra o pão dos outros...".
E o moço da padaria esboçou um leve sorriso na cara vermelha e triste que se mostrou naquele momento. Visivelmente abalado pelas palavras do menino, chamou-o mais pra perto e falou baixinho: "Sente ali naquela mesinha que vou lhe servir por conta da casa uma boa xícara de café com leite e um pão com manteiga, tá certo? Sente ali que já volto...".
"Você é bom demais seu moço, e juro que vou comer com gosto, pois tô com a fome de um bezerro". E seguiu em direção à mesa.
Uns dois minutos após e o homem colocou à sua frente um pão com queijo e manteiga, um pedaço de bolo de ovos e um copo cheio de café com leite. Os olhos do menino brilharam de alegria e satisfação. A fome não deixou que dissesse mais nada, a não ser começar a beliscar aquilo tudo.
Depois que se fartou e passou a apresentar uma feição mais alegre, Zezinho levantou, recolheu o prato, os talheres e o copo e foi em direção ao balcão, pedindo para que o moço lhe desse um pano para passar na mesinha.
"Mas ora, guri, nem pense em fazer isto, pois logo estará limpinha. Mas agora que já não está mais com cara de fome me diga uma coisa, você vai pra onde assim?" Perguntou o moço. E o menino prontamente respondeu:
"Vou procurar e encontrar minha mãe que ficou lá na rodoviária me esperando. Por falar nisso, o senhor pode me dizer pra que lado fica a rodoviária, aquela onde para um monte de ônibus e é cheinha de gente pra todo lado?"
Antes de responder, o moço perguntou: "E sua mãe sabe que você anda aqui por essas bandas?". "Ah, não tenho certeza se ela sabe onde eu tô agora, mas sei que ela tá me esperando lá na rodoviária porque a gente vai viajar pra bem longe. Acho que é pra São Paulo". Disse o menino na maior inocência do mundo.
"Então tome essa moeda aqui e caminhe mais dois trechos naquela direção – Apontando para o lado direito da rua - até chegar num ponto de ônibus. Lá você pede as pessoas para lhe informarem quando passa o ônibus que vai pra rodoviária. Então você entra, paga sua passagem e diz ao cobrador que vai descer na rodoviária. E é só isso e boa viagem. Ah, espere aí – E foi buscar mais alguma coisa -, leve esses dois pães nesse embrulho que é para o caso da fome aparecer novamente.
Zezinho não saiu da padaria sem agradecer ao homem por tudo de mais sagrado que existisse. E quando já estava na calçada ouviu alguém lhe chamando:
"Ei garotinho, por favor venha aqui". Era uma senhora que ficou grande parte do tempo ouvindo o diálogo inicial entre o menino e o moço da padaria. E assim que Zezinho se aproximou ela continuou:
"Eu estava há pouco aí dentro e não pude deixar de ouvir você conversar. Parabéns por demonstrar ser um menino sério e respeitoso. Mas você gostaria de ganhar algumas moedas limpando um pequeno jardim na minha casa, logo ali adiante?".
"Acho que ainda tenho um tempinho. Depois é que vou encontrar minha mãe. Vamos lá...". Disse Zezinho.


continua...




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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