*Rangel Alves da Costa
Hoje, aqui no sertão sergipano, em Poço
Redondo, meu berço de nascimento e onde sou fiel visitante, presenciei duas
situações diferentes num mesmo contexto. E após isso, pensando e pensando, cheguei
à conclusão que aquelas situações poderiam simbolizar muito mais. Então vamos
às explicações. Logo cedinho, nas proximidades de casa, a feira semanal se
abria em mil cores, sabores, sortimentos e tentações. Uma profusão de frutas,
verduras, carnes, doces, bolos, roupas, panos, remédios milagreiros, ervas
medicinais e plantas, produtos de despensa e cozinha, fumo de rolo, feijão de
corda, tudo o que se imaginasse. E um monte de gente passeando pelas barracas,
caminhando de lado a outro, escolhendo os seus produtos. Andei por lá e depois
retornei. Já passava das três da tarde quando novamente me bandeei por aqueles
lados. A feira já tinha acabado e somente os seus restos por todo lugar,
espalhados pelo chão, pelas bancas, numa sujeira danada. Perguntei-me: logo
cedo tudo tão belo e atraente, e por que agora apenas essa imundície toda?
Tirei algumas fotografias e depois fiz uma pequena postagem, dizendo assim: Fim
de feira. Assim também em muita da ilusão da vida!
Repito: Fim de feira. Assim também em muita
da ilusão da vida! Creio que nem necessitaria explicar muito sobre isso. Mas
creio também que nem todo mundo possa compreender a analogia expressa nas
palavras. Ora, a feira em si, aquela do alvorecer e tão cheia de flores, de
frutos e de tudo o que se desejar, pode ser vista como a própria vida em seu
alvorecer, em seu resplendor, em sua seiva maior. A feira, aquela que encanta o
olhar e faz a boca se encher de água, pode ser vista também como os melhores
anos da vida, com a existência em seu fulgor, com o viver na plenitude da
caminhada. A feira, aquela onde a melancia bonita está diante do olhar e a
cocada branca só falta pedir que a leve, pode ser vista também como um tempo de
poder quase tudo, como uma fase onde quase tudo pode ser adquirido, como um
período onde o ser humano pode lançar sua mão e alcançar o desejado. Sim pois a
feira é assim, é a possibilidade de se ter o almejado, pois perante tudo aquilo
que se deseja. Da feira a pessoa retorna com suas compras, com seus anseios
realizados, com aquilo desejado para o momento. Da feira a pessoa retorna
trazendo consigo o útil, o que vai de grande importância no seu viver. Depois
das compras, de encher os carrinhos e retornar, nem sempre a pessoa olha pra
trás para se perguntar como aquela mesma feira estará mais tarde. E muito menos
se perguntar: e depois do fim da feira?
Depois do fim da feira outra realidade, e
muito diferente da feira em si. Os viços, os gostos, os sabores, as cores, os
aromas, os perfumes, os desejos, nada disso existe mais. Depois da feira
somente os restos, as cascas, os bagos sujos, as folhas lançadas ao chão, as
xepas apodrecidas e os visgos malcheirosos. Depois da feira somente o que já
não se deseja, pois dificilmente a pessoa vai se abaixar para uma jaca podre e
cheia de sujeira lançada ao chão. Alguns empobrecidos ainda passam a catar
bananas podres, laranjas moles, restos deixados por imprestáveis, mas a maioria
das pessoas não. Muitos sequer desejam ser avistados em meios aos corredores
putrefatos e imundos do fim da feira. Na verdade, quando a feira chega ao fim,
quando o bom e o útil já não pode mais ser adquirido, então surge a revelação
de que toda bonança se transforma em restos indesejados. Tudo que estava sobre
a banca era bom, era bonito, era almejado, mas o que de repente restou sobre a
mesma banca é simplesmente negado.
E a vida, e a vida? Sim, na vida também um
fim de feira. A pessoa não quer assim, ou sequer se imagina assim, mas a
verdade é que é vista, olhada e amada até quando sua feira está sortida.
Depois, depois da chegada da velhice, do empobrecimento ou da enfermidade, tudo
passa a ser negado como um fim de feira.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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