*Rangel Alves da Costa
De repente se ouve, principalmente no mundo
interiorano: “A riqueza pode ter de tudo, pode dizer que esfarela e desalinha,
mas em ordem de pobre num fico muito por debaixo não. Em ordem de pobre tenho
casa arrumada, móvel pra sentar, mesa pra comer e fogão pra cozinhar. Fome
também não passo não, pois em ordem de pobre minha feira é sortida e garantida”.
Já outra, mais estabanada, logo diz: “Em
ordem de pobre sou a pessoa mais rica. Tenho tudo mais que o rico. Tenho mais
filhos, tenho mais dívidas, tenho mais precisão, mas também tenho alegria pra
dar e vender, tenho coragem e força pra correr atrás do que preciso e ainda
sustento essa vagabundagem na política. O pobre pode ser pobre, mas tem o valor
maior do mundo em época de eleição”.
E a tal ordem de pobre vai correndo de boca
em boca, vai cortando estrada e caminho, passando a fazer do linguajar
cotidiano da população. Por todo lugar vai surgindo alguém que diz não ser
rico, porém, perante a sua situação, de nada pode reclamar. Quer dizer que não
é o fato de ser pobre que impede de a pessoa buscar e adquirir aquilo que
precisa.
Em ordem de pobre é termo é expressão das
mais usadas, ainda que nem todos que pronunciam saibam o verdadeiro sentido na
contextualização das palavras. Contudo, continua valendo mais a
intencionalidade, pois mais acertada, que o seu aprofundamento no contexto dos
regionalismos gramaticais.
Pois bem. Acaso já tenha ouvido a expressão
“Sou pobre, mas sou limpinha”, ou ainda “A casa é pobre, mas no pouco ou no
muito ninguém passa fome”, tenha-se uma aproximação imediata à famosa “Em ordem
de pobre...”. E que vem sempre acompanhado de sentenças como “vive bem demais”,
“não falta nada”, “tem de tudo”, “tem para dar e sobrar”, etc.
Na junção, assim se teria “Em ordem de pobre
vive bem demais”. “Em ordem de pobre não falta nada”, “Em ordem de pobre tem de
tudo”, “Em ordem de pobre tem para dar e sobrar”. Significa dizer que mesmo
sendo pobre não lhe falta isso ou aquilo.
O termo “ordem” utilizado no dizer
costumeiro, nada mais significa que a classe social distintiva daquela de maior
poder aquisitivo. Não diz, contudo, que o pobre tem de ser miserável ou
desvalido demais, bastando que esteja numa linha de deficiência econômica em
relação às demais. Assim como tem a ordem dos ricos, dos bem de vida e dos
remediados, também existe uma ordem dos pobres: aqueles que têm perante suas
condições.
Com efeito, fato interessante é que pessoas
de pouco poder aquisitivo mais parecem recebedoras de bons salários. As casas
pode atém ser pequenas, mas dentro delas até o luxo nos móveis e nos demais
utensílios. Ganha pouco, um salário mínimo ou pouco mais, mas nunca deixa de
estar bem vestidas, com roupas bonitas e novas, sapatos e bijuterias. É um “luxo”
como fruto de grande esforço.
Assim acontece porque o dito pobre não se
entrega de vez à sua baixa condição econômica. Não se diminui nem se submete
pela fragilidade financeira, não baixa a cabeça por nada. Como se discípulos
fossem de Joãosinho Trinta e sua famosa frase dizendo que povo é quem gosta de
luxo, assim essa ordem social vai vivendo para demonstrar que em nada está
aquém daquela endinheirada.
E essa classe endinheirada certamente sequer
se aproxima do muito que o pobre faz com tão pouco. Não falta o churrasco
domingueiro, a cerveja gelada, o pagode, a festança. E nunca falta o sorriso, a
alegria e o trejeito próprio na dança da vida.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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